Roberto Amaral, um ministro na corda bamba?
Cristiano Romero

Um dos mais criticados ministros do governo Lula, Roberto Amaral, da C&T, recentemente escapou por pouco da degola.

Considerado uma das poucas heranças benditas do governo FHC, o ministério de Amaral é hoje um poço de problemas.

Ninguém gosta do ministro: a comunidade científica, o PT, a equipe econômica, o Palácio do Planalto, alguns setores do seu próprio partido (o PSB) e os secretários que ele não nomeou para a Pasta.

O ministro não está propriamente prestigiado em Brasília, mas, por questões estratégicas, ganhou uma sobrevida no cargo.

Provavelmente, ficará no posto até a reforma ministerial, prevista para acontecer após a votação das reformas previdenciária e tributária.

Amaral foi socorrido nos últimos dias pelo governador de Alagoas, Ronaldo Lessa, seu correligionário mais fiel no PSB.

Incomodado com a 'fritura' que o ministro vinha sofrendo, Lessa procurou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante reunião com governadores do Nordeste. Queria saber se Amaral estava firme no cargo.

O presidente respondeu que o ministro deu várias 'trombadas' no início do governo, mas que agora ele estava indo bem.

Coincidência ou não, o ministro foi incluído, dias depois, na comitiva presidencial que visitaria cinco países africanos esta semana.

Lessa convenceu-se de que a situação de Amaral está pacificada. Não é bem assim.

O presidente Lula decidiu não mexer no ministério agora porque isso poderia atrapalhar a já difícil tramitação das reformas. O MCT é da cota do PSB, partido que, no Congresso, vem sendo mais leal ao presidente do que o próprio PT.

Amaral tem dificuldades dentro do seu partido. Sua indicação para o cargo foi costurada por ele mesmo junto à cúpula do PT. Amaral é um integrante histórico do PSB.

Está no partido há muito mais tempo que as duas maiores expressões da sigla: o dep. Miguel Arraes (PE) e o ex-governador Anthony Garotinho.

Vice-presidente do PSB, ele conhece bem o presidente da República e seus principais auxiliares. Nas quatro campanhas presidenciais de Lula, Amaral participou de todas como representante do PSB.

O presidente percebeu que teria problemas com o ministro antes mesmo da posse. Definida a nomeação de Amaral para o MCT, depois de negociações do próprio com o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, Lula reuniu-se com Arraes em clima de celebração.

Para sua surpresa, o ex-governador de Pernambuco retrucou: 'Ele não é exatamente o meu candidato, mas...'.

Lula não tinha mais como voltar atrás. A escolha estava feita, mas, desde então, o presidente sabia que o novo ministro não era uma unanimidade nem no seu partido.

Muitos imaginavam que ele havia sido indicado por Garotinho. Não foi. 'Amaral foi indicado por ele mesmo', conta um importante integrante do PSB. 'Oficialmente, damos sustentação, mas sabemos que ele será substituído na reforma ministerial.'

'O Roberto Amaral foi uma solução da máquina partidária para superar o impasse entre Garotinho e Arraes', explica um político que conhece bem o caso.

O PT, por sua vez, esperava uma indicação técnica do PSB. 'Quando o PT ofereceu o ministério ao PSB, mirou no físico Sérgio Rezende e acabou acertando no Amaral', revela uma fonte.

Rezende é um dos físicos mais renomados do país. Tem o apoio da comunidade científica e, politicamente, é ligado a Arraes, tendo sido, inclusive, secretário de C&T quando ele foi governador.

Hoje, Rezende preside a Finep, a agência de fomento do MCT. Está cotadíssimo para assumir o lugar de Amaral.

A fragilidade política do ministro vem sendo agravada por sua gestão.

Nos primeiros meses de governo, por problemas de interlocução com a área econômica, o MCT quase perdeu, para outras Pastas, a sua galinha dos ovos de ouro: os fundos setoriais, mecanismo que duplicou os investimentos em C&T nos últimos anos.

Em 2002, os fundos tiveram R$ 1,2 bilhão para investir.

'Cada ministério controlaria o fundo de sua área. Como eles não têm instrumentos, tradição nem departamentos especializados para o uso desses recursos em inovação e pesquisa, os fundos acabariam sendo pulverizados e dispersados. Seu mau uso acabaria extinguindo-os', disse, em entrevista ao 'Valor', Ennio Candotti, presidente da SBPC.

Foi, aliás, graças a uma carta do SBPC ao presidente Lula que os fundos setoriais foram mantidos na órbita do MCT.

Quando foram criados, inclusive com a ajuda do PT no Congresso, os fundos setoriais não podiam sofrer contingenciamento orçamentário.

Esta foi a maneira encontrada para evitar que, mesmo nos momentos de crise, os gastos com C&T diminuíssem. O que justifica essa precaução é o atraso tecnológico brasileiro.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2002 proibiu a possibilidade de corte nos fundos. Fraco politicamente, Amaral não conseguiu impedir, no entanto, o contingenciamento.

Em 2003, os fundos estão perdendo 50% de seus recursos. 'Esse corte é ilegal. A LDO obrigava o gasto integral dos fundos', atesta fonte do setor.

Numa decisão polêmica, Roberto Amaral quis extinguir o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), organização social criada também na gestão do ministro Ronaldo Sardenberg para, sem as restrições burocráticas do serviço público, detectar oportunidades de inovação tecnológica no país e aproximar o MCT dos setores produtivos.

A manobra foi abortada pelo ministro-chefe da Secretaria de Comunicação do governo e Gestão Estratégica, Luiz Gushiken, que não só manteve o CGEE como está pensando em colocar o Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE) para funcionar dentro de sua estrutura - dentre outras tarefas, cabe ao NAE subsidiar as discussões sobre a futura política industrial do governo Lula.

O 'Valor' tinha entrevista marcada com o secretário-executivo do MCT, Wanderley de Souza, em 23 de julho.

Naquele dia, a assessoria de imprensa de Roberto Amaral desmarcou a entrevista, com a promessa de que o próprio ministro receberia a reportagem nos dias 24 ou 25. Nenhum contato foi feito pelo MCT até o fechamento desta edição, sete dias após o prazo estipulado pela assessoria.
(Valor Econômico, 4/8)




 

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