Gratuidade nas federais ainda provoca debate
Marta Salomon

'Gastos públicos com as Universidades são importantes no sentido de que estas avançam a inovação e o desenvolvimento tecnológico. Não podem ser avaliados somente do ponto de vista do seu efeito sobre a igualdade.'

Incluído no relatório produzido pelo Banco Mundial entre os principais comentários às propostas de uma segunda fase de reformas no Brasil, debatidas em julho pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o trecho parecia arquivar a idéia de rediscutir o papel (e o custo) das Universidades públicas no Brasil.

Só parecia. Ao comentar o relatório do Bird, o secretário-executivo do conselho, ministro Tarso Genro, disse que o debate continuaria na relação do banco com o governo.

'O Banco Mundial quer interferir no modelo de desenvolvimento, é uma interferência que parte do poder dos empréstimos que oferece', argumentou Genro. O banco diz dispor de US$ 8 bilhões para empréstimos ao país nos próximos quatro anos.

No início de julho, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (espécie de órgão consultivo do governo) recebeu um resumo do documento 'Políticas para um Brasil Justo, Sustentável e Competitivo', produzido pelo Banco Mundial após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.

No pacote de sugestões, um dos alvos é o ensino superior do país, cujos gastos 'beneficiam apenas poucos privilegiados', diz o documento do Bird. As observações do banco não eram propriamente uma novidade.

Desde 95, o Banco Mundial insiste em que é preciso melhorar a qualidade do gasto social no país.

Havia, desde então, dois alvos bem claros de 'distorções' a serem corrigidas: o sistema de aposentadoria do setor público, cuja reforma é discutida no Congresso, e a Universidade pública.

O fim da gratuidade tem adversários fortes no governo Lula, a começar pelo próprio ministro da Educação, Cristovam Buarque.

'No MEC não se discute Universidade paga pelos alunos. A Universidade pública presta um serviço público e tem de ser paga pelo Estado, trata-se de uma instituição estratégica para o país', sustenta o ministro da Educação.

Cristovam Buarque diz que não vê 'clima' para a discussão decolar no país, embora a tese tenha reunido adeptos importantes, como a economista Sonia Rocha, da Fundação Getúlio Vargas do RJ, especialista em pobreza.

'Pergunte ao Banco Mundial se eles propõem cobrar a escola militar de Key West [nos EUA]', provoca o ministro.

Relatório do Banco Mundial, apresentado em março de 2002 a pedido do então ministro da Educação, Paulo Renato Souza, notava que o governo já se afastava de um modelo de controle direto do sistema universitário.

Mas destacava que a 'clara ineficiência' das Universidades públicas inspirava reformas -nas quais o banco se manteria como parceiro, papel que já desempenhou no governo FHC.

O modelo aplaudido no estudo do Bird é o do Chile, onde foram duas as palavras-chave: desempenho e privatização.

'O Brasil gasta cerca de US$ 5,4 bilhões com suas Universidades federais, aproximadamente US$ 13,5 mil por aluno. Embora sejam gratuitas para os alunos, sua qualidade é muito irregular', analisa o banco, registrando uma rápida expansão das instituições privadas, de perfil heterogêneo.
(Folha de SP, 3/8)

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