Membro da SBPC/CE adverte: Sem apoio, cientistas vão embora

Representantes da SBPC regional discutem sobre a inconstância de apoio sustentado à pesquisa

A formação de um pesquisador é longa.

'Geralmente, ele passa entre quatro e cinco anos na graduação da Universidade, mais dois anos no mestrado e quatro no doutorado. Ainda vai ter que se confirmar como pesquisador, o que no Brasil, pode ser através de publicações internacionais. Na volta do doutorado, deve se engajar em um grupo de pesquisa.'

O engenheiro Fernando de Carvalho Gomes é quem ensina o caminho das pedras. Secretário regional adjunto da SBPC e chefe do Depto. de Computação da UFC, ele faz pesquisa na área de inteligência artificial. E conhece as vicissitudes de quem exerce a atividade de pesquisa.

'Essa inconstância de apoio sustentado à pesquisa está levando muitas pessoas embora do país. Não é que sejam pessoas egoístas, mas não estão vendo oportunidades aqui. Às vezes, a pessoa está no meio da pesquisa e o dinheiro prometido acaba', conta Fernando.

Como conseqüência, as patentes saem pela porta. 'O que descobrimos, teremos que comprar futuramente. 90% da dívida externa do Brasil é de compra de tecnologia que, em parte, poderia ser nossa e até exportada.'

Os professores Armênio Aguiar e Fernando de Carvalho citam o caso de um pesquisador paulista, Sérgio Ferreira, que se interessou por estudar como a picada de jararaca levava à morte.

Ele descobriu que o veneno potencializava a ação de uma substância endógena, a bradicinina, que é o principal agente hipotensor do organismo.

'A indústria farmacêutica verificou que a descoberta poderia ser transformada em produto e criou um remédio para hipertensão arterial que foi patenteado fora e, hoje, os brasileiros pagam por ele', diz Fernando.

Mesmo nos EUA, a maior parte das patentes não provém das Universidades, mas das indústrias que encontram nas pesquisas um interesse do mercado.

'Quem deve transformar a pesquisa em produto são as empresas. A Universidade deve atuar na produção de ciência, na formação de pessoas e estar interessada em conhecimento novo. A transferência desse conhecimento para as empresas também é papel da Universidade', ressalta Fernando.

Segundo o médico e professor Armênio Aguiar dos Santos, ainda são poucas as indústrias brasileiras que se interessam por pesquisa.

'Poucas têm um programa de controle efetivo de qualidade. Se não têm sequer controle de qualidade, como pensar em desenvolver patentes para os produtos, aplicar em ciência?', critica Armênio.

Ele estuda como se dá a movimentação do trato intestinal em situações de desidratação ou de excesso de líquido no organismo. O professor lembra que a ciência dá retornos a longo prazo.

Daí a dificuldade de se conseguir apoio. Isso sem falar nas necessidades emergenciais por que o povo brasileiro passa no cotidiano.

'Por isso, há necessidade de termos, no Estado, um agente público que possa compreender essas contradições e desenvolver ações que possam minorar esse quadro', defende Armênio.

'A Universidade não pode ser o Depto. de pesquisa da indústria. As indústrias devem ter o seu Depto. de pesquisa que interaja com os pesquisadores da Universidade', completa Fernando.

Os professores citam o retorno para o país dos estudos da Embrapa ao longo de 40 anos investindo na formação de pesquisadores.

'Tivemos muitos ganhos com o agrobusiness. O Brasil exporta grãos porque tem a tecnologia. Uma das que mais se desenvolveram no país foi a pesquisa em produção agrícola', afirma Armênio.

O principal setor que recebeu investimentos da Funcap em 2001, segundo ele, foram as ciências agrárias e a animal. Em segundo lugar, as ciências da saúde e biológicas.

Ano passado, conforme o Relatório Anual da Funcap, a área das ciências da saúde e biológica recebeu o maior número de bolsas de formação acadêmica (mestrado, doutorado e iniciação científica).

Mas a área das ciências agrárias e animal continua tendo o maior percentual de recursos aplicados, com 27,15%, seguida das ciências exatas e da terra com 24,45%. (Ana Cecília Mesquita - 3/9)

Fonte: Financial Times/Mídia Global

 


 

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