Prêmio Capes destaca teses de doutorado desenvolvidas no IOC como melhores do Brasil
Estudos sobre a epidemiologia da malária na região amazônica e a miocardite chagásica renderam dois prêmios ao Instituto Oswaldo Cruz (IOC), em concurso realizado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior do Ministério da Educação (Capes/MEC). Em sua primeira edição, o Prêmio Capes, que destaca as melhores teses de doutorado aprovadas por cursos reconhecidos pelo MEC, afirmou a excelência do IOC em pesquisa biomédica ao premiar dois trabalhos desenvolvidos pelo Instituto: Aspectos Epidemiológicos da Malária no Parque Nacional do Jaú, Amazonas, Brasil , do programa de pós-graduação em Medicina Tropical , e Migração de células inflamatórias para o tecido cardíaco durante a fase aguda precoce da infecção experimental pelo Trypanosoma cruzi: identificação de alvos terapêuticos , do programa de pós-graduação em Biologia Parasitária. A cerimônia de entrega dos prêmios acontece dia 9 de novembro (quinta-feira). As teses vencedoras do Prêmio Capes foram automaticamente inscritas no Grande Prêmio Capes de Teses, que elege os três melhores trabalhos, um de cada conjunto de grandes áreas: ciências biológicas, ciências da saúde e ciências agrárias; engenharias e ciências exatas e da terra; e ciências humanas, lingüística, letras e artes e ciências sociais aplicadas e na área de ensino de ciências.
Estudo discute realidade epidemiológica da malária na região amazônica
A prevalência da malária no Parque Nacional do Jaú (PNJ), localizado a 220 km de Manaus, foi o tema da tese Aspectos Epidemiológicos da Malária no Parque Nacional do Jaú, Amazonas, Brasil . Orientada por José Rodrigues Coura , chefe do Departamento de Medicina Tropical do IOC,
e por Marcelo Urbano Ferreira, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP), a pesquisadora Simone Ladeia Andrade analisou 540 indivíduos das 14 comunidades que habitam os dois rios do Parque, localizado a 220 km de Manaus, entre novembro de 2002 e julho de 2003. Além de dados entomológicos, foram investigadas informações sobre endemicidade local, prevalência e fatores associados à infecção, apresentação clínica e resposta humoral da população às diferentes espécies de parasito do gênero Plasmodium – agente etiológico da malária.
Simone Ladeia Andrade |
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As comunidades que habitam os rios do Parque Nacional do Jaú foram alvo do estudo epidemiológico da malária premiado pela Capes |
A pesquisa indicou a distribuição heterogênea da doença, a despeito da proximidade entre as áreas do PNJ, a intensificação do número de casos nos últimos anos, transmissão intradomiciliar e alta prevalência de infecção em períodos fora do pico de transmissão. A apresentação clínica também foi analisada pelo estudo.“Entre os infectados houve 60,8% de assintomáticos, alguns, inclusive, com microscopia convencional positiva, o que atenta para a importância da realização do exame em todos os indivíduos de uma área sob busca ativa e não somente entre aqueles que apresentarem sintomas”, a pesquisadora resume, referindo-se à rotina de ação de técnicos da Secretaria de Vigilância em Saúde no controle da endemia.
Uma avaliação longitudinal evidenciou a necessidade de acompanhamento prolongado de infectados assintomáticos antes de defini-los como tal, além de ausência de infecção e infecção assintomática como prováveis conseqüências de certo grau de imunidade adquirida pela população, ainda que a área não seja hiperendêmica nem de transmissão contínua da malária. Quanto à avaliação entomológica, foi constatado que o Anopheles darlingi é o principal vetor da malária no Parque Nacional do Jaú, com predomínio intradomiciliar, pouso nas redes e picos de atividades entre 18h e 23h, o que pode ajudar a orientar ações antivetorias no controle da endemia. Para dar continuidade ao trabalho, Simone pretende aprofundar a avaliação entomológica, introduzir educação específica e continuada para a população local e aplicar novas medidas de controle, a partir dos resultados obtidos em seu doutorado. "O prêmio é um grande estímulo à continuação do trabalho: subjetivamente, ratifica o valor da pesquisa e justifica seu aprofundamento; objetivamente, abre novas possibilidades de cooperação e financiamento", a jovem pesquisadora comemora.
Definição de alvos terapêuticos na miocardite chagásica
Migração das células inflamatórias para o tecido cardíaco durante a fase aguda precoce da infecção experimental pelo Trypanossoma cruzi: alvos terapêuticos foi a tese de doutorado que conquistou o Prêmio Capes pelo programa de pós-graduação em Biologia Parasitária do IOC. Orientada por Joseli Lannes, chefe do Laboratório de Pesquisas em Auto-imunidade e Imuno-regulação, a pesquisadora Ana Paula Maia Peixoto Marino investigou a ocorrência de miocardite durante a fase crônica da doença de Chagas. A miocardite é a principal causa de óbito entre pacientes chagásicos e atinge de 20 a 30% dos infectados.
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Tecido cardíaco de camundongo infectado na fase aguda (esq) e na fase crônica (dir) da doença de Chagas |
Ana Paula acompanhou a evolução da doença em modelos experimentais da fase aguda da infecção e constatou o predomínio de células CD8 e a presença de moléculas como VCAM-1 e ICAM-1, expressas pelo endotélio dos vasos sanguíneos do coração dos animais infectados, que têm importante papel para a entrada de células durante a infecção no tecido cardíaco. “Detectamos algumas moléculas quimiotáticas, que participam da atração seletiva das células, que justificariam o predomínio das células CD8 no tecido cardíaco”, a pesquisadora explica. “No próprio tecido cardíaco havia o aumento da expressão dessas moléculas e de células inflamatórias, que expressam o receptor que as reconhece. Se conseguirmos bloquear estes receptores, poderemos amenizar a inflamação”, completa, indicando uma possível estratégia terapêutica.
A pesquisa indicou o bloqueio da migração mediada por receptores de quimiocinas, no caso, CCR1/CCR5, como alvo terapêutico. Além disso, apontou a utilização de met-RANTES, antagonista parcial de RANTES, como potencial imunomodulador para a miocardite chagásica – utilizado experimentalmente na modulação da inflamação em modelos de artrite e alergia, reduzindo a inflamação. “São alvos interessantes para serem estudados, mas, de qualquer forma, já desponta uma nova oportunidade de tratamento para a miocardite na doença de Chagas. Resta-nos aprofundar o conhecimento sobre os mecanismos envolvidos na modulação do infiltrado presente no tecido cardíaco durante a infecção pelo Trypanosoma cruzi, tanto pelas moléculas de adesão quanto pelas quimiocinas, e estudar o papel dessas moléculas na fase crônica da infecção – o que é essencial para que possamos avaliar seu real papel terapêutico”, Ana Paula apresenta.
"Nosso trabalho é importante porque vai além de sua área e abre novos caminhos para o estudo de inflamações ao dissociar o processo inflamatório exarcebado que leva à disfunção do órgão-alvo da resposta imune protetora, o que também é desejado em miocardites de origem viral e bacteriana", Joseli considera. "Álém disso, a pesquisa alia inovação tecnológica ao compromisso de retorno à sociedade, pois ao mesmo tempo em que utiliza ferramentas modernas de biologia molecular e celular, farmacologia e imunologia, tem a doença de Chagas como objeto de estudo, um agravo importante para a população brasileira e da América Latina", conclui.
"Receber este prêmio é maravilhoso, ele traz visibilidade ao projeto, aumenta as possibilidades de interação e de captação de novos recursos que auxiliem o seu desenvolvimento. E isso é um reconhecimento pessoal e profissional, pois o doutorado é uma fase de formação intensa, em que o estudante sedimenta conhecimentos adquiridos no mestrado e tenta firmar parcerias e colaborações com outros grupos de pesquisa", Ana Paula comemora.
Bel Levy
31/10/2006
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