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A burocracia científica, artigo de Eloi S. Garcia*

<SPAN >O saudoso professor Fernando Ubatuba, meu pai científico, uma vez me disse que o que mais o irritava eram os convites para as reuniões nas Universidades e Institutos de Pesquisa que, puramente burocráticos ou de &ldquo;faz de conta&rdquo;, não levavam à nada.<BR> </SPAN>
Por Jornalismo IOC22/05/2007 - Atualizado em 10/12/2019
O saudoso professor Fernando Ubatuba, meu pai científico, uma vez me disse que o que mais o irritava eram os convites para as reuniões nas Universidades e Institutos de Pesquisa que, puramente burocráticos ou de faz de conta, não levavam à nada.

Ele sempre respondia energicamente: Estou pensando em ciência, orientando meus estudantes e realizando experiências, não tenho tempo para essas reuniões.

Se insistissem no convite ele respondia: Ainda não parei de pensar, orientar e executar meus experimentos, portanto não posso ir, agradeço o convite.

Tantos anos após estas históricas respostas, continuam os convites aos pesquisadores de infindáveis e intermináveis reuniões.

Nos dias de hoje, participar de algum projeto institucional se converteu em um sacrifício enorme e em um abandono da atividade mais nobre: pensar e fazer ciência.

Não resta dúvida de que o desenvolvimento de boas hipóteses científicas não se pode dispersar e requer uma dedicação quase que exclusiva.

Apesar disto, as Universidades e Institutos de Pesquisa têm uma habilidade fantástica de nos afastar do que sabemos e queremos fazer: ciência.

Desenvolver um projeto de pesquisa hoje é quase impossível, tantos são os formulários que temos que preencher e reuniões que devemos participar.

Formulários do Ibama, da comissão de ética humana e animal, da comissão de radioatividade, da biossegurança, dos relatórios infinitos de produtividade institucional e tudo o mais.

Dirigir um projeto de pesquisa e participar das atividades institucionais deveria ser simples para sobrar todo o tempo possível para o trabalho nobre do laboratório.

Mas, infelizmente, tem sido a coisa mais difícil na vida do cientista, uma grande parte de seu tempo produtivo é dedicada a isto, e o pior, isto vem a constituir uma fonte enorme de insatisfação e desprazer do pesquisador.

Esta situação se agrava por falta de pessoal de apoio direto ao laboratório de pesquisa e excesso de pessoal na burocracia oficial.

Nos laboratórios de pesquisa faltam pessoal administrativo competente, auxiliares e técnicos que possam socorrer os pesquisadores.

Os esforços feitos pelo governo em incorporar nas Universidades e Institutos de Pesquisa cientistas de qualidade ao sistema de ciência e tecnologia podem ir água a baixo se esta situação não for corrigida.

O mundo desenvolvido possui estruturas científicas eficientes e os laboratórios possuem pessoal de apoio competente e técnico que auxilia os pesquisadores em suas atividades.

Assim, na lógica científica, a oferta de concursos para pesquisadores deve ser seguida de seleção de pessoal de apoio (gestão e administrativo) e técnico, e estes devem facilitar ao máximo o trabalho do cientista.

Não devemos nos surpreender com a existência de um bom número de pesquisadores excelentes em nosso país, mas devemos deixá-los fazer o trabalho mais nobre: ciência.

Estamos no tempo em que se valoriza o parâmetro numérico como forma objetiva de êxito de um pesquisador ou de uma instituição científica. Cada vez mais o sucesso institucional é medido pelo número e qualidade dos artigos científicos publicados.

Poucos pensam nas condições adequadas em que os cientistas brasileiros realizam seus trabalhos ou se suas idéias poderão ser executadas tendo o apoio administrativo necessário.

Torna-se imprescindível que as instituições dedicadas à pesquisa se modernizem para viver neste novo mundo e que o sistema burocrático institucional funcione para quem quer fazer ciência: os cientistas.

* Eloi S. Garcia é pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz, ex-presidente da Fiocruz e membro da Academia Brasileira de Ciências. O artigo foi publicado pelo autor no Jornal da Ciência.


04/04/07

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Por: 
jornalismo

O saudoso professor Fernando Ubatuba, meu pai científico, uma vez me disse que o que mais o irritava eram os convites para as reuniões nas Universidades e Institutos de Pesquisa que, puramente burocráticos ou de faz de conta, não levavam à nada.



Ele sempre respondia energicamente: Estou pensando em ciência, orientando meus estudantes e realizando experiências, não tenho tempo para essas reuniões.



Se insistissem no convite ele respondia: Ainda não parei de pensar, orientar e executar meus experimentos, portanto não posso ir, agradeço o convite.



Tantos anos após estas históricas respostas, continuam os convites aos pesquisadores de infindáveis e intermináveis reuniões.



Nos dias de hoje, participar de algum projeto institucional se converteu em um sacrifício enorme e em um abandono da atividade mais nobre: pensar e fazer ciência.



Não resta dúvida de que o desenvolvimento de boas hipóteses científicas não se pode dispersar e requer uma dedicação quase que exclusiva.



Apesar disto, as Universidades e Institutos de Pesquisa têm uma habilidade fantástica de nos afastar do que sabemos e queremos fazer: ciência.



Desenvolver um projeto de pesquisa hoje é quase impossível, tantos são os formulários que temos que preencher e reuniões que devemos participar.



Formulários do Ibama, da comissão de ética humana e animal, da comissão de radioatividade, da biossegurança, dos relatórios infinitos de produtividade institucional e tudo o mais.



Dirigir um projeto de pesquisa e participar das atividades institucionais deveria ser simples para sobrar todo o tempo possível para o trabalho nobre do laboratório.



Mas, infelizmente, tem sido a coisa mais difícil na vida do cientista, uma grande parte de seu tempo produtivo é dedicada a isto, e o pior, isto vem a constituir uma fonte enorme de insatisfação e desprazer do pesquisador.



Esta situação se agrava por falta de pessoal de apoio direto ao laboratório de pesquisa e excesso de pessoal na burocracia oficial.



Nos laboratórios de pesquisa faltam pessoal administrativo competente, auxiliares e técnicos que possam socorrer os pesquisadores.



Os esforços feitos pelo governo em incorporar nas Universidades e Institutos de Pesquisa cientistas de qualidade ao sistema de ciência e tecnologia podem ir água a baixo se esta situação não for corrigida.



O mundo desenvolvido possui estruturas científicas eficientes e os laboratórios possuem pessoal de apoio competente e técnico que auxilia os pesquisadores em suas atividades.



Assim, na lógica científica, a oferta de concursos para pesquisadores deve ser seguida de seleção de pessoal de apoio (gestão e administrativo) e técnico, e estes devem facilitar ao máximo o trabalho do cientista.



Não devemos nos surpreender com a existência de um bom número de pesquisadores excelentes em nosso país, mas devemos deixá-los fazer o trabalho mais nobre: ciência.



Estamos no tempo em que se valoriza o parâmetro numérico como forma objetiva de êxito de um pesquisador ou de uma instituição científica. Cada vez mais o sucesso institucional é medido pelo número e qualidade dos artigos científicos publicados.



Poucos pensam nas condições adequadas em que os cientistas brasileiros realizam seus trabalhos ou se suas idéias poderão ser executadas tendo o apoio administrativo necessário.



Torna-se imprescindível que as instituições dedicadas à pesquisa se modernizem para viver neste novo mundo e que o sistema burocrático institucional funcione para quem quer fazer ciência: os cientistas.

* Eloi S. Garcia é pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz, ex-presidente da Fiocruz e membro da Academia Brasileira de Ciências. O artigo foi publicado pelo autor no Jornal da Ciência.



04/04/07

Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)