Homenageando os 15 anos do Programa de Pós-graduação Stricto sensu em Ensino em Biociências e Saúde, o Núcleo de Estudos Avançados do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) discutiu os rumos da educação no Brasil. A edição realizada no dia 18 de setembro recebeu o sociólogo, mestre em planejamento educacional e doutor em filosofia da educação Luiz Antonio Cunha, professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Autor de pesquisas sobre a formação dos sistemas educacionais e as políticas para o setor no Brasil, ele analisou o cenário atual, considerando especialmente o contexto a partir da redemocratização, período que esteve no foco de uma de suas principais obras: o livro “Educação, Estado e Democracia”.
Luiz Antonio Cunha apontou eleitorismo, experimentalismo pedagógico e voluntarismo ideológico como principais vieses das políticas educacionais. Foto: Gutemberg BritoNa abertura do encontro, o pesquisador Renato Cordeiro, coordenador do Núcleo de Estudos, ressaltou a relevância da Pós-graduação em Ensino em Biociências e Saúde e do debate sobre educação. “Há 15 anos [como diretor do IOC], tive a honra de contribuir para a criação desse importante Programa, que atua na formação de docentes e pesquisadores na área de ensino. Em um momento de cortes orçamentários na ciência e na educação, é muito oportuno recebermos o professor Luiz Antonio Cunha para apresentar a palestra ‘Crise da educação no Brasil: caminhos e descaminhos’”, declarou Renato, que coordena a atividade junto com a pesquisadora Maria de Lourdes Aguiar.
A presença de vieses políticos e ideológicos que levam à falta de continuidade nas políticas educacionais brasileiras foi um dos temas destacados pelo professor. Segundo ele, o ‘vai-e-vem’ de medidas dificulta a avaliação de sua efetividade, uma vez que o período de um mandato é um tempo curto para o campo da educação. A descontinuidade também dificulta a mobilização de docentes e administradores, o que é fundamental para transformações. “Professores e gestores precisam ter adesão subjetiva para colocar as políticas educacionais em prática. Com a descontinuidade, se desenvolve uma atitude reativa, de não envolvimento com nenhuma mudança”, afirmou Luiz Antonio.
O eleitorismo, o experimentalismo pedagógico e o voluntarismo ideológico foram os principais vieses observados pelo sociólogo em sua análise do período da redemocratização, com paralelos no momento atual. Segundo ele, o eleitorismo está ligado à adoção ou à rejeição de medidas com foco na obtenção de votos. O experimentalismo pedagógico refere-se à criação de políticas com base em casos pontuais de sucesso, do presente ou do passado, sem testes suficientes. Já o voluntarismo ideológico pode apresentar-se tanto em governos de esquerda como de direita. “Logo após a redemocratização, observamos voluntarismos da esquerda, com projetos que visavam acabar com a miséria ou com a alienação no curto tempo de um mandato de prefeito ou governador. Atualmente, vemos a ênfase da direita em temas como escola sem partido, ensino religioso, retorno da disciplina de moral e cívica e criação de escolas cívico-militares”, enumerou o professor.
Considerando as propostas do movimento escola sem partido, Luiz Antonio notou que o Ministério Público e o Supremo Tribunal Federal têm se manifestado contra medidas que restrinjam a liberdade dos professores em sala de aula. Ele lembrou a liminar concedida pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso que suspendeu o efeito da ‘Lei da Escola Livre’ promulgada pela Assembleia Legislativa de Alagoas. Entre outros pontos, a decisão considerou que ‘a liberdade de ensinar é um mecanismo essencial para provocar o aluno e estimulá-lo a produzir seus próprios pontos de vista’. “Essa é uma questão de importância pedagógica, pois coloca que os alunos terão seus próprios pontos de vista, enquanto o movimento escola sem partido é centrado nos valores do pais”, comentou.
Debate abordou impacto e medidas para combater desigualdades raciais, sociais e regionais da educação básica à pós-graduação. Foto: Gutemberg BritoCom pesquisas recentes focadas na relação entre laicidade do Estado e a educação, o sociólogo apontou que a disciplina de religião é a única do currículo escolar mencionada em todas as constituições brasileiras desde 1934. Atualmente prevista como facultativa, a matéria foi oferecida em aproximadamente 70% das escolas de ensino fundamental em 2017, segundo dados do levantamento ‘Prova Brasil’, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Entre as unidades que ofertaram a disciplina, mais de 50% exigiram frequência obrigatória e 77% não ofereceram atividades alternativas aos estudantes nos horários das aulas de religião. “Apesar de a disciplina ser oficialmente optativa, existe uma indução à obrigatoriedade do ensino religioso de fato no Brasil”, avaliou.
O professor questionou ainda o impacto de medidas como o retorno da disciplina de moral e cívica ao currículo escolar e a criação de escolas cívico-militares. Ele lembrou que os primeiros colégios militares foram criados após a guerra do Paraguai, que ocorreu entre 1864 e 1870, com o objetivo de atender os filhos dos soldados mortos no conflito. Além das unidades mantidas pelas Forças Armadas, nos últimos anos vários estados tiveram expansão do número de escolas geridas por Policiais Militares ou Bombeiros. Considerando a proposta do governo federal que prevê a criação de mais 216 escolas cívico-militares até 2023, o sociólogo argumentou que o número é pequeno em relação ao conjunto da rede de ensino fundamental no país. “Só na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, existem mais de mil escolas. Nesse contexto, essa medida não deve ter efeito significativo para a educação, a não ser a subtração de recursos e o apelo político-ideológico”, ponderou Luiz Antonio.
Apesar dos vieses políticos e ideológicos, o sociólogo destacou que houve conquistas importantes para a educação no Brasil a partir da redemocratização. Segundo ele, os principais avanços do período estão associados à expansão do atendimento pelo setor público na educação básica, à despolitização do financiamento da educação pública e ao combate à discriminação social e cultural no âmbito escolar.
Luiz Antonio apontou que o aumento da oferta de vagas na rede pública foi fundamental para expandir o acesso à educação básica no Brasil. Considerando os segmentos de educação infantil, ensino fundamental e superior, mais de 80% das matrículas em 2018 ocorreram em escolas públicas. “Mesmo com o grande peso do setor privado na educação infantil, vemos que o conjunto da educação básica está grandemente atendido pelo setor público no país”, afirmou o professor, ponderando que o setor privado se mantém presente na educação brasileira não apenas através das escolas particulares, mas também do fornecimento de livros didáticos. “Ao ano, são mais de R$ 1 bilhão gastos em 140 milhões de exemplares distribuídos para 30 milhões de alunos. As compras do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) representam mais da metade da produção das editoras de livros do Brasil”, citou.
A criação de mecanismos que garantem as transferências de recursos destinados ao custeio da educação foi responsável pelo que o sociólogo chamou de despolitização do financiamento. De acordo com Luiz Antonio, a Constituição de 1988 determinou as fontes de recursos para o setor, obrigando o investimento de no mínimo 18% das receitas da União e 25% dos estados e municípios, além do valor recolhido por meio de um tributo que incide sobre a folha de pagamento das empresas. Para impedir que as disputas políticas interferissem no repasse de verbas entre os diferentes níveis de governo, legislações posteriores estabeleceram regras que obrigam a transferência na proporção do número de alunos matriculados. Atualmente, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) é o mecanismo utilizado. O professor ressaltou que a validade da medida termina em 2020 e um novo projeto precisa ser aprovado no Congresso Nacional para substituí-la. “É preciso estar atento para que os recurso da educação não voltem para os balcões de negócios da política”, afirmou, chamando atenção também para a Desvinculação de Receitas da União (DRU), mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% de todos os tributos vinculados por lei a fundos ou despesas, incluindo as verbas da educação.
Entre as ações contra a discriminação nas escolas, o sociólogo citou as a inclusão do ensino de história e cultura afrobrasileira e indígena na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e as ações de combate à violência e discriminação contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT). Luiz Antonio apontou que as legislações aprovadas demoram para ter efeito prático devido a dificuldades que vão da inércia de professores e gestores até a resistência ativa de grupos contrários às medidas. “O sistema educacional não cria discriminações mas reproduz e potencializa o que está na sociedade. Políticas educacionais que permitam às escolas se contraporem a essa tendência são um importante caminho para combater a discriminação”, disse o professor.
Questões ligadas às desigualdades raciais, sociais e regionais foram abordadas no debate realizado após a palestra. A coordenadora da Pós-graduação em Ensino Biociências e Saúde, Tania Arújo-Jorge, ressaltou a relevância da discussão na celebração de 15 anos do Programa e apontou a necessidade de inclusão no ensino superior e na pós-graduação. “Quando vamos mudar o perfil dos pesquisadores? A inclusão começou a acontecer e já foi cerceada novamente, com o corte de bolsas. Atualmente [no IOC], temos cotas de matrículas, mas não de bolsas, e essa discussão tem sido levantada pelos nossos estudantes”, apontou. O diretor do IOC, José Paulo Gagliardi Leite, levantou o tema das diferenças regionais. “Fazendo uma reflexão sobre caminhos e descaminhos, é importante considerar uma série de estudos onde vemos, no mapa da educação no Brasil, a desigualdade entre as regiões Sul e Sudeste e as regiões Norte e Nordeste”, comentou.
A necessidade de expandir o número de vagas mantendo a qualidade do ensino superior foi apontada pelo vice-diretor de Ensino, Informação e Comunicação, Marcelo Alves Pinto. “Temos universidades públicas com ensino de boa qualidade, pesquisa e iniciação científica. Em comparação, temos muitas escolas privadas que apresentam um padrão de ensino pautado principalmente por métricas de conteúdo e aprovação”, ponderou. Já o coordenador do Núcleo de Estudos, Renato Cordeiro, chamou atenção para o impacto dos cortes de bolsas na pós-graduação. "Com os absurdos cortes das bolsas da Capes, os programas com notas 3 e 4 progressivamente serão fechados por falta absoluta de estudantes. Espero que os coordenadores dos programas 5, 6 e 7 sejam solidários, apoiando os cursos com notas 3 e 4, em fase de consolidação", afirmou.
Luiz Antonio disse que foi contrário às ações afirmativas no passado, mas mudou de opinião a partir do contato com estudantes cotistas. Ele defendeu ações para apoiar a permanência desses alunos nos cursos de graduação e pós-graduação, incluindo bolsas, alojamento e aulas de reforço, caso necessárias. O sociólogo destacou também a necessidade de inovação para que as universidades públicas possam receber maior número de alunos. “Nós docentes temos responsabilidade. Não podemos multiplicar os padrões atuais de docência para atingir mais alunos. São necessárias mudanças estruturais ou, de outra maneira, reproduziremos o elitismo usando discurso democratizante”, afirmou.
Homenageando os 15 anos do Programa de Pós-graduação Stricto sensu em Ensino em Biociências e Saúde, o Núcleo de Estudos Avançados do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) discutiu os rumos da educação no Brasil. A edição realizada no dia 18 de setembro recebeu o sociólogo, mestre em planejamento educacional e doutor em filosofia da educação Luiz Antonio Cunha, professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Autor de pesquisas sobre a formação dos sistemas educacionais e as políticas para o setor no Brasil, ele analisou o cenário atual, considerando especialmente o contexto a partir da redemocratização, período que esteve no foco de uma de suas principais obras: o livro “Educação, Estado e Democracia”.
Luiz Antonio Cunha apontou eleitorismo, experimentalismo pedagógico e voluntarismo ideológico como principais vieses das políticas educacionais. Foto: Gutemberg BritoNa abertura do encontro, o pesquisador Renato Cordeiro, coordenador do Núcleo de Estudos, ressaltou a relevância da Pós-graduação em Ensino em Biociências e Saúde e do debate sobre educação. “Há 15 anos [como diretor do IOC], tive a honra de contribuir para a criação desse importante Programa, que atua na formação de docentes e pesquisadores na área de ensino. Em um momento de cortes orçamentários na ciência e na educação, é muito oportuno recebermos o professor Luiz Antonio Cunha para apresentar a palestra ‘Crise da educação no Brasil: caminhos e descaminhos’”, declarou Renato, que coordena a atividade junto com a pesquisadora Maria de Lourdes Aguiar.
A presença de vieses políticos e ideológicos que levam à falta de continuidade nas políticas educacionais brasileiras foi um dos temas destacados pelo professor. Segundo ele, o ‘vai-e-vem’ de medidas dificulta a avaliação de sua efetividade, uma vez que o período de um mandato é um tempo curto para o campo da educação. A descontinuidade também dificulta a mobilização de docentes e administradores, o que é fundamental para transformações. “Professores e gestores precisam ter adesão subjetiva para colocar as políticas educacionais em prática. Com a descontinuidade, se desenvolve uma atitude reativa, de não envolvimento com nenhuma mudança”, afirmou Luiz Antonio.
O eleitorismo, o experimentalismo pedagógico e o voluntarismo ideológico foram os principais vieses observados pelo sociólogo em sua análise do período da redemocratização, com paralelos no momento atual. Segundo ele, o eleitorismo está ligado à adoção ou à rejeição de medidas com foco na obtenção de votos. O experimentalismo pedagógico refere-se à criação de políticas com base em casos pontuais de sucesso, do presente ou do passado, sem testes suficientes. Já o voluntarismo ideológico pode apresentar-se tanto em governos de esquerda como de direita. “Logo após a redemocratização, observamos voluntarismos da esquerda, com projetos que visavam acabar com a miséria ou com a alienação no curto tempo de um mandato de prefeito ou governador. Atualmente, vemos a ênfase da direita em temas como escola sem partido, ensino religioso, retorno da disciplina de moral e cívica e criação de escolas cívico-militares”, enumerou o professor.
Considerando as propostas do movimento escola sem partido, Luiz Antonio notou que o Ministério Público e o Supremo Tribunal Federal têm se manifestado contra medidas que restrinjam a liberdade dos professores em sala de aula. Ele lembrou a liminar concedida pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso que suspendeu o efeito da ‘Lei da Escola Livre’ promulgada pela Assembleia Legislativa de Alagoas. Entre outros pontos, a decisão considerou que ‘a liberdade de ensinar é um mecanismo essencial para provocar o aluno e estimulá-lo a produzir seus próprios pontos de vista’. “Essa é uma questão de importância pedagógica, pois coloca que os alunos terão seus próprios pontos de vista, enquanto o movimento escola sem partido é centrado nos valores do pais”, comentou.
Debate abordou impacto e medidas para combater desigualdades raciais, sociais e regionais da educação básica à pós-graduação. Foto: Gutemberg BritoCom pesquisas recentes focadas na relação entre laicidade do Estado e a educação, o sociólogo apontou que a disciplina de religião é a única do currículo escolar mencionada em todas as constituições brasileiras desde 1934. Atualmente prevista como facultativa, a matéria foi oferecida em aproximadamente 70% das escolas de ensino fundamental em 2017, segundo dados do levantamento ‘Prova Brasil’, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Entre as unidades que ofertaram a disciplina, mais de 50% exigiram frequência obrigatória e 77% não ofereceram atividades alternativas aos estudantes nos horários das aulas de religião. “Apesar de a disciplina ser oficialmente optativa, existe uma indução à obrigatoriedade do ensino religioso de fato no Brasil”, avaliou.
O professor questionou ainda o impacto de medidas como o retorno da disciplina de moral e cívica ao currículo escolar e a criação de escolas cívico-militares. Ele lembrou que os primeiros colégios militares foram criados após a guerra do Paraguai, que ocorreu entre 1864 e 1870, com o objetivo de atender os filhos dos soldados mortos no conflito. Além das unidades mantidas pelas Forças Armadas, nos últimos anos vários estados tiveram expansão do número de escolas geridas por Policiais Militares ou Bombeiros. Considerando a proposta do governo federal que prevê a criação de mais 216 escolas cívico-militares até 2023, o sociólogo argumentou que o número é pequeno em relação ao conjunto da rede de ensino fundamental no país. “Só na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, existem mais de mil escolas. Nesse contexto, essa medida não deve ter efeito significativo para a educação, a não ser a subtração de recursos e o apelo político-ideológico”, ponderou Luiz Antonio.
Apesar dos vieses políticos e ideológicos, o sociólogo destacou que houve conquistas importantes para a educação no Brasil a partir da redemocratização. Segundo ele, os principais avanços do período estão associados à expansão do atendimento pelo setor público na educação básica, à despolitização do financiamento da educação pública e ao combate à discriminação social e cultural no âmbito escolar.
Luiz Antonio apontou que o aumento da oferta de vagas na rede pública foi fundamental para expandir o acesso à educação básica no Brasil. Considerando os segmentos de educação infantil, ensino fundamental e superior, mais de 80% das matrículas em 2018 ocorreram em escolas públicas. “Mesmo com o grande peso do setor privado na educação infantil, vemos que o conjunto da educação básica está grandemente atendido pelo setor público no país”, afirmou o professor, ponderando que o setor privado se mantém presente na educação brasileira não apenas através das escolas particulares, mas também do fornecimento de livros didáticos. “Ao ano, são mais de R$ 1 bilhão gastos em 140 milhões de exemplares distribuídos para 30 milhões de alunos. As compras do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) representam mais da metade da produção das editoras de livros do Brasil”, citou.
A criação de mecanismos que garantem as transferências de recursos destinados ao custeio da educação foi responsável pelo que o sociólogo chamou de despolitização do financiamento. De acordo com Luiz Antonio, a Constituição de 1988 determinou as fontes de recursos para o setor, obrigando o investimento de no mínimo 18% das receitas da União e 25% dos estados e municípios, além do valor recolhido por meio de um tributo que incide sobre a folha de pagamento das empresas. Para impedir que as disputas políticas interferissem no repasse de verbas entre os diferentes níveis de governo, legislações posteriores estabeleceram regras que obrigam a transferência na proporção do número de alunos matriculados. Atualmente, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) é o mecanismo utilizado. O professor ressaltou que a validade da medida termina em 2020 e um novo projeto precisa ser aprovado no Congresso Nacional para substituí-la. “É preciso estar atento para que os recurso da educação não voltem para os balcões de negócios da política”, afirmou, chamando atenção também para a Desvinculação de Receitas da União (DRU), mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% de todos os tributos vinculados por lei a fundos ou despesas, incluindo as verbas da educação.
Entre as ações contra a discriminação nas escolas, o sociólogo citou as a inclusão do ensino de história e cultura afrobrasileira e indígena na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e as ações de combate à violência e discriminação contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT). Luiz Antonio apontou que as legislações aprovadas demoram para ter efeito prático devido a dificuldades que vão da inércia de professores e gestores até a resistência ativa de grupos contrários às medidas. “O sistema educacional não cria discriminações mas reproduz e potencializa o que está na sociedade. Políticas educacionais que permitam às escolas se contraporem a essa tendência são um importante caminho para combater a discriminação”, disse o professor.
Questões ligadas às desigualdades raciais, sociais e regionais foram abordadas no debate realizado após a palestra. A coordenadora da Pós-graduação em Ensino Biociências e Saúde, Tania Arújo-Jorge, ressaltou a relevância da discussão na celebração de 15 anos do Programa e apontou a necessidade de inclusão no ensino superior e na pós-graduação. “Quando vamos mudar o perfil dos pesquisadores? A inclusão começou a acontecer e já foi cerceada novamente, com o corte de bolsas. Atualmente [no IOC], temos cotas de matrículas, mas não de bolsas, e essa discussão tem sido levantada pelos nossos estudantes”, apontou. O diretor do IOC, José Paulo Gagliardi Leite, levantou o tema das diferenças regionais. “Fazendo uma reflexão sobre caminhos e descaminhos, é importante considerar uma série de estudos onde vemos, no mapa da educação no Brasil, a desigualdade entre as regiões Sul e Sudeste e as regiões Norte e Nordeste”, comentou.
A necessidade de expandir o número de vagas mantendo a qualidade do ensino superior foi apontada pelo vice-diretor de Ensino, Informação e Comunicação, Marcelo Alves Pinto. “Temos universidades públicas com ensino de boa qualidade, pesquisa e iniciação científica. Em comparação, temos muitas escolas privadas que apresentam um padrão de ensino pautado principalmente por métricas de conteúdo e aprovação”, ponderou. Já o coordenador do Núcleo de Estudos, Renato Cordeiro, chamou atenção para o impacto dos cortes de bolsas na pós-graduação. "Com os absurdos cortes das bolsas da Capes, os programas com notas 3 e 4 progressivamente serão fechados por falta absoluta de estudantes. Espero que os coordenadores dos programas 5, 6 e 7 sejam solidários, apoiando os cursos com notas 3 e 4, em fase de consolidação", afirmou.
Luiz Antonio disse que foi contrário às ações afirmativas no passado, mas mudou de opinião a partir do contato com estudantes cotistas. Ele defendeu ações para apoiar a permanência desses alunos nos cursos de graduação e pós-graduação, incluindo bolsas, alojamento e aulas de reforço, caso necessárias. O sociólogo destacou também a necessidade de inovação para que as universidades públicas possam receber maior número de alunos. “Nós docentes temos responsabilidade. Não podemos multiplicar os padrões atuais de docência para atingir mais alunos. São necessárias mudanças estruturais ou, de outra maneira, reproduziremos o elitismo usando discurso democratizante”, afirmou.
Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)