Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) amplia conhecimento sobre a resposta imunológica na Covid-19.
Analisando amostras de pacientes hospitalizados pela doença, incluindo pessoas que convivem com HIV, a pesquisa observou associação entre a produção precoce de anticorpos neutralizantes e menor tempo de internação pela doença.
“Os anticorpos neutralizantes são capazes de impedir o SARS-CoV-2 de infectar células. Nosso estudo sugere que aqueles indivíduos com produção rápida desses anticorpos desenvolvem quadros menos severos”, afirma a pesquisadora do Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC e coordenadora do estudo, Dalziza de Almeida.
Pesquisadoras padronizaram ensaio baseado em pseudovírus para detecção de anticorpos neutralizantes contra o SARS-CoV-2 e avaliaram amostras de mais de cem pacientes. Foto: Gutemberg BritoA pesquisa foi liderada pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) em parceria com o Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz).
No IOC, os Laboratórios de Aids e Imunologia Molecular e de Genômica Funcional e Bioinformática participaram da investigação. Os resultados foram publicados na revista científica internacional Microbiology Spectrum.
Para dosar os anticorpos neutralizantes, o estudo aplicou uma metodologia inovadora, chamada de ensaio baseado em pseudovírus. A técnica foi padronizada a partir de plataforma implantada para estudo do HIV.
Em comparação com o método padrão (o teste de neutralização de redução de placas, conhecido pela sigla em inglês PRNT), o ensaio baseado em pseudovírus entrega resultados mais rápidos e precisos.
Além disso, não apresenta risco de infecção para os pesquisadores, o que permite realizar os experimentos em laboratório com nível mínimo de biossegurança, chamado de NB1.
Por envolver a manipulação do SARS-CoV-2, o teste PRNT precisa ocorrer em laboratório com nível de biossegurança 3 (NB3), devido ao alto risco para a saúde dos profissionais.
Metodologia implantada no Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC apresenta resultado rápido e preciso, sem risco de infecção para os profissionais. Foto: Gutemberg Brito“Essa metodologia facilita o desenvolvimento de estudos sobre a resposta imunológica, o que é importante para compreender os mecanismos de defesa contra os agentes infecciosos e pode auxiliar na definição dos correlatos de proteção vacinal com maior reprodutibilidade. Reduzir as dificuldades é um dos objetivos da inovação”, explica Dalziza.
Os correlatos de proteção vacinal são marcadores imunológicos que podem ser dosados no sangue como indicadores da proteção conferida pela vacina. Com frequência, anticorpos neutralizantes são considerados como correlatos de proteção vacinal.
O projeto, incluindo a implantação da metodologia, teve financiamento do Programa Inova Fiocruz e da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj). Também contou com apoio dos Institutos Nacionais de Saúde, dos Estados Unidos, através do Programa de Reagentes para HIV Aids.
O estudo caracterizou a produção de anticorpos neutralizantes em 103 pacientes que foram hospitalizados com Covid-19 entre junho de 2020 e maio de 2021, quando ainda não tinham sido vacinados.
As análises apontaram que a maior parte dos indivíduos, 88%, apresentava anticorpos neutralizantes no sangue no momento da internação, indicando uma resposta imune robusta. Por outro lado, 12% apresentavam nível de anticorpos inferior ao mínimo detectável no exame.
Em média, os pacientes com anticorpos indetectáveis permaneceram 27 dias internados contra 14 dias daqueles com resposta imune robusta.
Segundo Dalziza, estudo reforça o papel dos anticorpos neutralizantes na fase inicial da resposta imune contra o SARS-CoV-2. Foto: Gutemberg BritoAo todo, 34 mortes foram registradas durante o estudo. Entre os pacientes que foram a óbito, o título médio de anticorpos ficou 40% abaixo do observado entre aqueles que conseguiram se recuperar da Covid-19.
“O tempo parece ser muito importante para a efetividade da resposta imune. Entre pacientes que morreram, observamos aumento na produção de anticorpos após 14 dias de internação, mas isso não foi suficiente para deter a progressão da doença”, observa Dalziza.
Os títulos médios de anticorpos neutralizantes foram semelhantes entre os indivíduos positivos e negativos para HIV.
Nenhum dos pacientes tinha quadro de Aids – quando o vírus prejudica o funcionamento do sistema imune a ponto de sucumbir a outras doenças. A maior parte já realizava terapia para HIV e alguns tinham identificado a infecção recentemente.
“Avaliamos a presença de anticorpos para HIV e SARS-CoV-2 no soro desses pacientes e vimos que eles conseguem manter a produção de anticorpos para os dois vírus", ressalta Dalziza, acrescentando que uma das perguntas da pesquisa era se a coinfecção estaria associada a quadros de maior gravidade na Covid-19.
“Em nosso estudo, observamos que os pacientes com HIV eram mais jovens do que os demais pacientes internados por Covid-19. Isso corrobora a ideia de que a infecção pelo HIV pode provocar um envelhecimento do sistema imune, aumentando o risco de agravamento da doença", acrescenta a pesquisadora.
Os pseudovírus poderiam ser descritos como vírus ocos, porque apresentam a estrutura exterior de um vírus, chamada de envelope, sem o material genético viral funcional no seu interior.
Essas partículas são capazes de infectar células, mas não conseguem se replicar, uma vez que não possuem o genoma completo. É por esse motivo que não oferecem risco de infecção para os pesquisadores e não precisam ser manipuladas em laboratório com alto grau de biossegurança, como ocorre com o vírus SARS-CoV-2.
Os pseudovírus também carregam um gene que é ativado após a infecção e produz uma proteína que emite fótons de luz quando oxidada, o que permite detectar a sua presença e quantificar a infecção com um equipamento de leitor de luminescência.
Essa característica é vantajosa para detectar e quantificar anticorpos neutralizantes em ensaios laboratoriais.
Quanto mais anticorpos neutralizantes houver no soro de um paciente, menos partículas de pseudovírus serão capazes de infectar uma cultura de célula, o que poderá ser medido pela quantidade de luminescência emitida.
“O ensaio com pseudovírus é muito fidedigno para a titulação de anticorpos e entrega resultado em 48 horas”, ressalta Dalziza.
Detecção de luminescência foi utilizada para quantificar presença de anticorpos neutralizantes nas amostras. Foto: Gutemberg BritoPara produzir pseudovírus, os pesquisadores utilizam técnicas de engenharia genética. Determinados trechos do código genético viral são inseridos em células, que funcionam como fábricas, produzindo proteínas virais e montando as partículas de pseudovírus.
É uma técnica complexa que foi introduzida no Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC para estudos sobre o HIV, a partir de 2012. O projeto foi coordenado pela pesquisadora Vera Bongertz, bioquímica que integrou a equipe responsável pelo primeiro isolamento do vírus HIV no Brasil, em 1987.
Para adaptar a metodologia para o SARS-CoV-2, os cientistas utilizaram a plataforma já estabelecida, construindo uma partícula híbrida: um pseudovírus com envelope semelhante ao do HIV, porém com presença da proteína Spike do coronavírus, conhecida como proteína S.
“A proteína S é a responsável pela entrada do coronavírus nas células. Com um pseudovírus que apresenta essa molécula, podemos detectar anticorpos que são capazes de se ligar ao SARS-CoV-2 e impedir a infecção”, explica Dalziza, que já tinha trabalhado na implantação da metodologia para o HIV e padronizou a técnica para o coronavírus no IOC.
Com a técnica implantada, os pesquisadores vêm realizando outras pesquisas, incluindo análises sobre a produção de anticorpos desencadeada pelas vacinas da Covid-19 e a resposta imune contra variantes do coronavírus.
“Esse trabalho é resultado da política de inovação do Instituto Oswaldo Cruz e da cooperação científica”, afirmou Dalziza, destacando a parceria com os profissionais do Centro Hospitalar Covid-19 e a equipe do estudo Recover-SUS, coordenado pela pesquisadora Beatriz Grinsztejn, do INI/Fiocruz. “Estamos abertos a novos projetos e colaborações em pesquisas envolvendo a resposta de anticorpos neutralizantes”, acrescentou.
Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) amplia conhecimento sobre a resposta imunológica na Covid-19.
Analisando amostras de pacientes hospitalizados pela doença, incluindo pessoas que convivem com HIV, a pesquisa observou associação entre a produção precoce de anticorpos neutralizantes e menor tempo de internação pela doença.
“Os anticorpos neutralizantes são capazes de impedir o SARS-CoV-2 de infectar células. Nosso estudo sugere que aqueles indivíduos com produção rápida desses anticorpos desenvolvem quadros menos severos”, afirma a pesquisadora do Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC e coordenadora do estudo, Dalziza de Almeida.
Pesquisadoras padronizaram ensaio baseado em pseudovírus para detecção de anticorpos neutralizantes contra o SARS-CoV-2 e avaliaram amostras de mais de cem pacientes. Foto: Gutemberg BritoA pesquisa foi liderada pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) em parceria com o Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz).
No IOC, os Laboratórios de Aids e Imunologia Molecular e de Genômica Funcional e Bioinformática participaram da investigação. Os resultados foram publicados na revista científica internacional Microbiology Spectrum.
Para dosar os anticorpos neutralizantes, o estudo aplicou uma metodologia inovadora, chamada de ensaio baseado em pseudovírus. A técnica foi padronizada a partir de plataforma implantada para estudo do HIV.
Em comparação com o método padrão (o teste de neutralização de redução de placas, conhecido pela sigla em inglês PRNT), o ensaio baseado em pseudovírus entrega resultados mais rápidos e precisos.
Além disso, não apresenta risco de infecção para os pesquisadores, o que permite realizar os experimentos em laboratório com nível mínimo de biossegurança, chamado de NB1.
Por envolver a manipulação do SARS-CoV-2, o teste PRNT precisa ocorrer em laboratório com nível de biossegurança 3 (NB3), devido ao alto risco para a saúde dos profissionais.
Metodologia implantada no Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC apresenta resultado rápido e preciso, sem risco de infecção para os profissionais. Foto: Gutemberg Brito“Essa metodologia facilita o desenvolvimento de estudos sobre a resposta imunológica, o que é importante para compreender os mecanismos de defesa contra os agentes infecciosos e pode auxiliar na definição dos correlatos de proteção vacinal com maior reprodutibilidade. Reduzir as dificuldades é um dos objetivos da inovação”, explica Dalziza.
Os correlatos de proteção vacinal são marcadores imunológicos que podem ser dosados no sangue como indicadores da proteção conferida pela vacina. Com frequência, anticorpos neutralizantes são considerados como correlatos de proteção vacinal.
O projeto, incluindo a implantação da metodologia, teve financiamento do Programa Inova Fiocruz e da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj). Também contou com apoio dos Institutos Nacionais de Saúde, dos Estados Unidos, através do Programa de Reagentes para HIV Aids.
O estudo caracterizou a produção de anticorpos neutralizantes em 103 pacientes que foram hospitalizados com Covid-19 entre junho de 2020 e maio de 2021, quando ainda não tinham sido vacinados.
As análises apontaram que a maior parte dos indivíduos, 88%, apresentava anticorpos neutralizantes no sangue no momento da internação, indicando uma resposta imune robusta. Por outro lado, 12% apresentavam nível de anticorpos inferior ao mínimo detectável no exame.
Em média, os pacientes com anticorpos indetectáveis permaneceram 27 dias internados contra 14 dias daqueles com resposta imune robusta.
Segundo Dalziza, estudo reforça o papel dos anticorpos neutralizantes na fase inicial da resposta imune contra o SARS-CoV-2. Foto: Gutemberg BritoAo todo, 34 mortes foram registradas durante o estudo. Entre os pacientes que foram a óbito, o título médio de anticorpos ficou 40% abaixo do observado entre aqueles que conseguiram se recuperar da Covid-19.
“O tempo parece ser muito importante para a efetividade da resposta imune. Entre pacientes que morreram, observamos aumento na produção de anticorpos após 14 dias de internação, mas isso não foi suficiente para deter a progressão da doença”, observa Dalziza.
Os títulos médios de anticorpos neutralizantes foram semelhantes entre os indivíduos positivos e negativos para HIV.
Nenhum dos pacientes tinha quadro de Aids – quando o vírus prejudica o funcionamento do sistema imune a ponto de sucumbir a outras doenças. A maior parte já realizava terapia para HIV e alguns tinham identificado a infecção recentemente.
“Avaliamos a presença de anticorpos para HIV e SARS-CoV-2 no soro desses pacientes e vimos que eles conseguem manter a produção de anticorpos para os dois vírus", ressalta Dalziza, acrescentando que uma das perguntas da pesquisa era se a coinfecção estaria associada a quadros de maior gravidade na Covid-19.
“Em nosso estudo, observamos que os pacientes com HIV eram mais jovens do que os demais pacientes internados por Covid-19. Isso corrobora a ideia de que a infecção pelo HIV pode provocar um envelhecimento do sistema imune, aumentando o risco de agravamento da doença", acrescenta a pesquisadora.
Os pseudovírus poderiam ser descritos como vírus ocos, porque apresentam a estrutura exterior de um vírus, chamada de envelope, sem o material genético viral funcional no seu interior.
Essas partículas são capazes de infectar células, mas não conseguem se replicar, uma vez que não possuem o genoma completo. É por esse motivo que não oferecem risco de infecção para os pesquisadores e não precisam ser manipuladas em laboratório com alto grau de biossegurança, como ocorre com o vírus SARS-CoV-2.
Os pseudovírus também carregam um gene que é ativado após a infecção e produz uma proteína que emite fótons de luz quando oxidada, o que permite detectar a sua presença e quantificar a infecção com um equipamento de leitor de luminescência.
Essa característica é vantajosa para detectar e quantificar anticorpos neutralizantes em ensaios laboratoriais.
Quanto mais anticorpos neutralizantes houver no soro de um paciente, menos partículas de pseudovírus serão capazes de infectar uma cultura de célula, o que poderá ser medido pela quantidade de luminescência emitida.
“O ensaio com pseudovírus é muito fidedigno para a titulação de anticorpos e entrega resultado em 48 horas”, ressalta Dalziza.
Detecção de luminescência foi utilizada para quantificar presença de anticorpos neutralizantes nas amostras. Foto: Gutemberg BritoPara produzir pseudovírus, os pesquisadores utilizam técnicas de engenharia genética. Determinados trechos do código genético viral são inseridos em células, que funcionam como fábricas, produzindo proteínas virais e montando as partículas de pseudovírus.
É uma técnica complexa que foi introduzida no Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC para estudos sobre o HIV, a partir de 2012. O projeto foi coordenado pela pesquisadora Vera Bongertz, bioquímica que integrou a equipe responsável pelo primeiro isolamento do vírus HIV no Brasil, em 1987.
Para adaptar a metodologia para o SARS-CoV-2, os cientistas utilizaram a plataforma já estabelecida, construindo uma partícula híbrida: um pseudovírus com envelope semelhante ao do HIV, porém com presença da proteína Spike do coronavírus, conhecida como proteína S.
“A proteína S é a responsável pela entrada do coronavírus nas células. Com um pseudovírus que apresenta essa molécula, podemos detectar anticorpos que são capazes de se ligar ao SARS-CoV-2 e impedir a infecção”, explica Dalziza, que já tinha trabalhado na implantação da metodologia para o HIV e padronizou a técnica para o coronavírus no IOC.
Com a técnica implantada, os pesquisadores vêm realizando outras pesquisas, incluindo análises sobre a produção de anticorpos desencadeada pelas vacinas da Covid-19 e a resposta imune contra variantes do coronavírus.
“Esse trabalho é resultado da política de inovação do Instituto Oswaldo Cruz e da cooperação científica”, afirmou Dalziza, destacando a parceria com os profissionais do Centro Hospitalar Covid-19 e a equipe do estudo Recover-SUS, coordenado pela pesquisadora Beatriz Grinsztejn, do INI/Fiocruz. “Estamos abertos a novos projetos e colaborações em pesquisas envolvendo a resposta de anticorpos neutralizantes”, acrescentou.
Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)