Um novo teste de diagnóstico desenvolvido por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) pode contribuir para o enfrentamento da hanseníase. Baseado na metodologia de PCR, o Kit NAT Hanseníase obteve registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O exame detecta o DNA do bacilo Mycobacterium leprae, causador do agravo, e pode facilitar a detecção precoce da doença, que atinge, em média, 27 mil pessoas por ano no Brasil.
A inovação foi desenvolvida pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) em parceria com o Instituto Carlos Chagas (Fiocruz-PR) e o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), ligado à Fiocruz e ao governo paranaense. Os pesquisadores ressaltam a importância da aplicação de uma metodologia de ponta contra uma doença negligenciada.
“Até então, não havia testes diagnósticos de hanseníase considerados padrão-ouro. É um marco colocar este exame à disposição de populações vulneráveis, que são as que mais desenvolvem a doença e carecem de avanços tecnológicos”, afirma o líder do projeto e chefe do Laboratório de Hanseníase do IOC, Milton Ozório Moraes.
Criação nacional: após décadas de pesquisas pela Fiocruz, o Brasil ganha o primeiro teste molecular do país para diagnóstico da hanseníase. Foto: Reprodução“Doenças tropicais negligenciadas, que são importantes no nosso país, não atraem o interesse da indústria. Com o Kit NAT Hanseníase, temos um teste nacional, com qualidade de primeiro mundo, que pode contribuir para a saúde da nossa população”, acrescenta o pesquisador da Fiocruz-PR, Alexandre Costa, que coordenou o desenvolvimento do exame no IBMP.
O Kit NAT Hanseníase é primeiro teste molecular comercial para a doença desenvolvido no Brasil e o segundo exame deste tipo a obter o registro da Anvisa. Ao longo de anos de pesquisas, o projeto contou com investimentos do Ministério da Saúde, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), da Fundação Novartis e da Leprosy Research Initiative (iniciativa internacional de apoio à pesquisa em hanseníase), além de recursos próprios da Fiocruz e do IBMP.
Uma das doenças mais antigas da humanidade, com relatos de casos desde 600 a.c., a hanseníase é um grave problema de saúde pública, especialmente no Brasil. O país registra o segundo maior número de casos do mundo. Além disso, entre as pessoas acometidas anualmente, mais de duas mil são diagnosticadas de forma tardia, com lesões neurológicas que provocam deformidades visíveis e prejudicam a visão ou o movimento das mãos ou dos pés.
A bactéria da hanseníase atinge principalmente a pele e os nervos. Entre os sintomas mais comuns da doença estão manchas na pele, que podem ter alteração de sensibilidade ao frio, calor ou dor. Mesmo sem manchas, áreas da pele com alteração de sensibilidade, diminuição de pelos e do suor também podem ser sinal do agravo, assim como o aparecimento de caroços no corpo, sensação de formigamento ou fisgadas e comprometimento neurológico, incluindo alterações sensitivas, motoras ou anatômicas.
Cerca de 70% das pessoas com hanseníase são diagnosticadas na atenção básica, pelo clínico geral, sem necessidade de exames complementares. Quando há dúvidas, os pacientes são encaminhados para atendimento especializado com o dermatologista. Porém, existem casos em que mesmo o especialista tem dificuldade de confirmar o diagnóstico. Nestas situações, o médico pode solicitar a biópsia, que é a retirada de fragmentos de pele para análise.
Segundo Milton, é justamente nestes casos que o Kit NAT Hanseníase pode ser um aliado valioso. Os exames atualmente disponíveis são a baciloscopia, que busca visualizar a bactéria, e a histopatologia, que analisa as alterações do tecido. Em relação a estas técnicas, o teste molecular apresenta uma vantagem importante: o aumento da sensibilidade.
“A baciloscopia costuma ser negativa nos pacientes que apresentam poucas lesões na pele. Nestes casos, chamados de paucibacilares, observamos que a sensibilidade da histopatologia é de 35%, enquanto o teste de PCR alcança 57%. Isso significa que, de cada cem pacientes com hanseníase paucibacilar, a histopatologia consegue identificar 35 e a PCR, 57. A combinação dos dois testes pode elevar a sensibilidade para 65%. É um ganho importante”, diz o pesquisador.
O desenvolvimento do Kit NAT Hanseníase é resultado de décadas de pesquisas pioneiras com o objetivo de contribuir para o Sistema Único de Saúde (SUS). Centro de referência nacional junto ao Ministério da Saúde, o Laboratório de Hanseníase do IOC atua na pesquisa, no ensino e no atendimento a pacientes, que é realizado por meio do Ambulatório Souza Araújo.
Metodologia que permite amplificar e detectar o material genético, a reação em cadeia da polimerase, conhecida pela sigla em inglês PCR, foi inventada em 1985. Em 1993, o Laboratório de Hanseníase foi o primeiro do Brasil a aplicar a técnica para a detecção do M. leprae.
Posteriormente, os pesquisadores aprimoraram a metodologia com base na técnica de PCR em tempo real, que simplificou e barateou o procedimento. Estudos realizados por diversos pesquisadores e estudantes de pós-graduação do IOC foram fundamentais para o sucesso do projeto.
A última etapa de trabalho consistiu na padronização da metodologia, com estudos de reprodutibilidade e estabilidade, que são essenciais para o registro na Anvisa. O desenvolvimento foi realizado em parceria com o IBMP, responsável pela produção de kits utilizados para o diagnóstico molecular de diversas doenças no SUS, como HIV, hepatites, dengue, Zika e chikungunya.
“A produção com boas práticas de fabricação, com controle de qualidade lote a lote, garante o desempenho do exame em diferentes laboratórios”, ressalta Alexandre.
O registro na Anvisa permite a comercialização do teste e é uma exigência para que o exame possa ser oferecido no SUS. A adoção da metodologia depende da avaliação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), que envia a recomendação ao Ministério da Saúde, responsável pela decisão final. “Se o kit for aprovado, temos capacidade de produção em larga escala para atender à população brasileira”, destaca Milton.
No Brasil, a hanseníase ocorre em todos os estados, com maior parte dos registros no Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Assim como outras doenças negligenciadas, a infecção está associada à pobreza. Pessoas com condições de habitação e alimentação precárias têm mais chance de adoecer por hanseníase. A dificuldade de acesso das populações vulneráveis aos serviços de saúde é um dos desafios para o diagnóstico precoce do agravo.
Em 2020, a pandemia de Covid-19 dificultou ainda mais as ações de controle da doença. Segundo o Ministério da Saúde, os números preliminares indicam que menos de 14 mil casos foram diagnosticados no ano passado, contra mais de 27 mil em 2019. Especialistas consideram que a redução pode ter ocorrido pela sobrecarga dos serviços de saúde e pelo medo dos pacientes de procurar atendimento.
O tratamento da hanseníase é oferecido gratuitamente pelo SUS. Feito com uma combinação de antibióticos, tem duração entre seis e 12 meses. Recentemente, a eficácia da terapia foi confirmada em uma pesquisa realizada no Ambulatório Souza Araújo. Logo após o começo do tratamento, os pacientes param de eliminar as bactérias em secreções nasais, gotículas da fala, tosse, espirro, interrompendo a transmissão do agravo.
Um novo teste de diagnóstico desenvolvido por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) pode contribuir para o enfrentamento da hanseníase. Baseado na metodologia de PCR, o Kit NAT Hanseníase obteve registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O exame detecta o DNA do bacilo Mycobacterium leprae, causador do agravo, e pode facilitar a detecção precoce da doença, que atinge, em média, 27 mil pessoas por ano no Brasil.
A inovação foi desenvolvida pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) em parceria com o Instituto Carlos Chagas (Fiocruz-PR) e o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), ligado à Fiocruz e ao governo paranaense. Os pesquisadores ressaltam a importância da aplicação de uma metodologia de ponta contra uma doença negligenciada.
“Até então, não havia testes diagnósticos de hanseníase considerados padrão-ouro. É um marco colocar este exame à disposição de populações vulneráveis, que são as que mais desenvolvem a doença e carecem de avanços tecnológicos”, afirma o líder do projeto e chefe do Laboratório de Hanseníase do IOC, Milton Ozório Moraes.
Criação nacional: após décadas de pesquisas pela Fiocruz, o Brasil ganha o primeiro teste molecular do país para diagnóstico da hanseníase. Foto: Reprodução“Doenças tropicais negligenciadas, que são importantes no nosso país, não atraem o interesse da indústria. Com o Kit NAT Hanseníase, temos um teste nacional, com qualidade de primeiro mundo, que pode contribuir para a saúde da nossa população”, acrescenta o pesquisador da Fiocruz-PR, Alexandre Costa, que coordenou o desenvolvimento do exame no IBMP.
O Kit NAT Hanseníase é primeiro teste molecular comercial para a doença desenvolvido no Brasil e o segundo exame deste tipo a obter o registro da Anvisa. Ao longo de anos de pesquisas, o projeto contou com investimentos do Ministério da Saúde, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), da Fundação Novartis e da Leprosy Research Initiative (iniciativa internacional de apoio à pesquisa em hanseníase), além de recursos próprios da Fiocruz e do IBMP.
Uma das doenças mais antigas da humanidade, com relatos de casos desde 600 a.c., a hanseníase é um grave problema de saúde pública, especialmente no Brasil. O país registra o segundo maior número de casos do mundo. Além disso, entre as pessoas acometidas anualmente, mais de duas mil são diagnosticadas de forma tardia, com lesões neurológicas que provocam deformidades visíveis e prejudicam a visão ou o movimento das mãos ou dos pés.
A bactéria da hanseníase atinge principalmente a pele e os nervos. Entre os sintomas mais comuns da doença estão manchas na pele, que podem ter alteração de sensibilidade ao frio, calor ou dor. Mesmo sem manchas, áreas da pele com alteração de sensibilidade, diminuição de pelos e do suor também podem ser sinal do agravo, assim como o aparecimento de caroços no corpo, sensação de formigamento ou fisgadas e comprometimento neurológico, incluindo alterações sensitivas, motoras ou anatômicas.
Cerca de 70% das pessoas com hanseníase são diagnosticadas na atenção básica, pelo clínico geral, sem necessidade de exames complementares. Quando há dúvidas, os pacientes são encaminhados para atendimento especializado com o dermatologista. Porém, existem casos em que mesmo o especialista tem dificuldade de confirmar o diagnóstico. Nestas situações, o médico pode solicitar a biópsia, que é a retirada de fragmentos de pele para análise.
Segundo Milton, é justamente nestes casos que o Kit NAT Hanseníase pode ser um aliado valioso. Os exames atualmente disponíveis são a baciloscopia, que busca visualizar a bactéria, e a histopatologia, que analisa as alterações do tecido. Em relação a estas técnicas, o teste molecular apresenta uma vantagem importante: o aumento da sensibilidade.
“A baciloscopia costuma ser negativa nos pacientes que apresentam poucas lesões na pele. Nestes casos, chamados de paucibacilares, observamos que a sensibilidade da histopatologia é de 35%, enquanto o teste de PCR alcança 57%. Isso significa que, de cada cem pacientes com hanseníase paucibacilar, a histopatologia consegue identificar 35 e a PCR, 57. A combinação dos dois testes pode elevar a sensibilidade para 65%. É um ganho importante”, diz o pesquisador.
O desenvolvimento do Kit NAT Hanseníase é resultado de décadas de pesquisas pioneiras com o objetivo de contribuir para o Sistema Único de Saúde (SUS). Centro de referência nacional junto ao Ministério da Saúde, o Laboratório de Hanseníase do IOC atua na pesquisa, no ensino e no atendimento a pacientes, que é realizado por meio do Ambulatório Souza Araújo.
Metodologia que permite amplificar e detectar o material genético, a reação em cadeia da polimerase, conhecida pela sigla em inglês PCR, foi inventada em 1985. Em 1993, o Laboratório de Hanseníase foi o primeiro do Brasil a aplicar a técnica para a detecção do M. leprae.
Posteriormente, os pesquisadores aprimoraram a metodologia com base na técnica de PCR em tempo real, que simplificou e barateou o procedimento. Estudos realizados por diversos pesquisadores e estudantes de pós-graduação do IOC foram fundamentais para o sucesso do projeto.
A última etapa de trabalho consistiu na padronização da metodologia, com estudos de reprodutibilidade e estabilidade, que são essenciais para o registro na Anvisa. O desenvolvimento foi realizado em parceria com o IBMP, responsável pela produção de kits utilizados para o diagnóstico molecular de diversas doenças no SUS, como HIV, hepatites, dengue, Zika e chikungunya.
“A produção com boas práticas de fabricação, com controle de qualidade lote a lote, garante o desempenho do exame em diferentes laboratórios”, ressalta Alexandre.
O registro na Anvisa permite a comercialização do teste e é uma exigência para que o exame possa ser oferecido no SUS. A adoção da metodologia depende da avaliação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), que envia a recomendação ao Ministério da Saúde, responsável pela decisão final. “Se o kit for aprovado, temos capacidade de produção em larga escala para atender à população brasileira”, destaca Milton.
No Brasil, a hanseníase ocorre em todos os estados, com maior parte dos registros no Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Assim como outras doenças negligenciadas, a infecção está associada à pobreza. Pessoas com condições de habitação e alimentação precárias têm mais chance de adoecer por hanseníase. A dificuldade de acesso das populações vulneráveis aos serviços de saúde é um dos desafios para o diagnóstico precoce do agravo.
Em 2020, a pandemia de Covid-19 dificultou ainda mais as ações de controle da doença. Segundo o Ministério da Saúde, os números preliminares indicam que menos de 14 mil casos foram diagnosticados no ano passado, contra mais de 27 mil em 2019. Especialistas consideram que a redução pode ter ocorrido pela sobrecarga dos serviços de saúde e pelo medo dos pacientes de procurar atendimento.
O tratamento da hanseníase é oferecido gratuitamente pelo SUS. Feito com uma combinação de antibióticos, tem duração entre seis e 12 meses. Recentemente, a eficácia da terapia foi confirmada em uma pesquisa realizada no Ambulatório Souza Araújo. Logo após o começo do tratamento, os pacientes param de eliminar as bactérias em secreções nasais, gotículas da fala, tosse, espirro, interrompendo a transmissão do agravo.
Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)