"Posso encostar no meu familiar ou cônjuge diagnosticado com hanseníase?"
"Temos que ficar em cômodos separados?"
"Precisamos distinguir copos e talheres?"
Essas são algumas das perguntas que refletem o estigma que ainda persiste em torno da hanseníase.
Apesar das manifestações clínicas ocorrerem na pele e no sistema nervoso periférico, a transmissão acontece por via respiratória, a partir de contato próximo e prolongado com gotículas de saliva eliminadas na fala ou secreções nasais do indivíduo infectado.
Outra característica significativa é que a transmissão somente acontece via pessoas com a forma multibacilar que não estejam em tratamento, devido à grande quantidade de bactérias no organismo.
“Quando dizemos contato próximo e prolongado, não necessariamente é um contato íntimo, como o beijo. Estamos falando da convivência por um determinado período de tempo em ambientes fechados, como casa, escritório ou sala de aula”, explica Anna Maria Sales, médica do Ambulatório Souza Araújo, unidade vinculada ao Laboratório de Hanseníase do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) que presta atendimento a pacientes com hanseníase, na sede da Fiocruz, no Rio de Janeiro.
“A pessoa para de transmitir a doença logo quando começa a fazer uso do medicamento. Isso reforça ainda mais a importância de buscar auxílio médico quando forem percebidos os primeiros sinais. Não há motivo para ficar relutante. Além de se curar e garantir qualidade de vida ao evitar sequelas, o paciente também evita a infecção de outros”, completa.
Embora muitas pessoas possam ser infectadas pelo bacilo M. leprae, a maioria consegue ter boa resposta imune e não desenvolve a doença. Ainda assim, devido ao seu lento período de incubação, que pode levar em torno de 2 a 5 anos, a médica reforça a importância de rastrear e examinar os contatos próximos do paciente nos últimos cinco anos.
“Precisamos avaliar não apenas as pessoas do ambiente domiciliar, mas também colegas de trabalho, escola, vizinhos, amigos próximos e parceiros. É importante rastrear todos que compartilharam de uma convivência mais próxima”, afirma Anna.
Os contatos passam por exames dermatoneurológicos para identificar possíveis manifestações da doença. Em alguns casos, pode ser feita uma investigação mais aprofundada. Caso a infecção não seja confirmada, é administrada uma dose da vacina BCG – a depender do histórico vacinal do contato.
“Se o contato tiver tomado apenas uma dose da vacina BCG ao longo da vida, será feita uma aplicação de reforço. Caso já tenha tomado as duas doses, não há necessidade de realizar outra. Esse protocolo é aplicado para os contatos tanto de pacientes da forma paucibacilar quanto multibacilar”, discorre a médica.
“Vale ressaltar que a vacina BCG não é específica para hanseníase, ou seja, não vai impedir que a pessoa tenha a doença. Contudo, a vacina evita um desenvolvimento mais grave caso ela venha a contrair a infecção”, acrescenta.
O tratamento da hanseníase é gratuito e deve ser iniciado logo após o paciente ser diagnosticado com a doença. Na forma paucibacilar, a terapia tem duração de 6 meses. Na forma multibacilar, o período é de um ano.
“Todo mês os pacientes precisam comparecer à unidade onde realizam o tratamento para fazerem a dose supervisionada, que é quando tomam a medicação do dia 1 acompanhados dos profissionais de saúde”, explica Anna.
Além da dose supervisionada, o paciente recebe também os medicamentos para serem tomados nos demais dias do mês.
O tratamento é ofertado nas Unidades Básicas de Saúde dos municípios e em Serviços de Referência associados ao Ministério da Saúde. No Rio de Janeiro, o Ambulatório Souza Araújo da Fiocruz é um desses Serviços.
Carinho e cuidado: a auxiliar de gestão do Ambulatório, Cristiane Domingues, faz questão de acompanhar de perto a evolução de cada paciente. Foto: Gutemberg Brito
“É importante que o paciente siga com a terapia até o fim. Seja na Unidade Básica, no hospital, ou no Serviço de Referência. Por isso, é imprescindível que todos esses locais tenham a medicação à disposição e profissionais da saúde prontos para atender”, reforça Anna.
Após curados, os pacientes precisam estar atentos a qualquer sinal de retorno da doença. Um dos motivos que pode levar a reincidência da hanseníase é a permanência de bacilos no organismo.
“Apesar de ser raro, o bacilo pode permanecer inativo no corpo e voltar a se multiplicar em algum momento da vida do paciente. Quanto mais regularmente o paciente seguir o tratamento, mais difícil a concretização desse cenário. Porém, como qualquer doença infecciosa, essa possibilidade não pode ser descartada”, aponta.
Outra forma de ocorrer a recidiva da hanseníase é contraindo novamente a infecção.
“A reinfecção não é comum, mas também pode acontecer se o paciente estiver em um ambiente endêmico com transmissão mantida. Por isso, é importante rastrear os contatos e tratar aquele grupo”, reforça.
O diagnóstico da hanseníase começa durante a anamnese – momento em que o profissional da saúde entrevista o paciente com perguntas específicas sobre sintomas e comportamentos que podem ajudar a desvendar o motivo das manifestações clínicas.
“A hanseníase só é identificada se o profissional que estiver atendendo pensar na doença, nem que seja por um breve momento. Por isso, é importante que médicos e enfermeiros tenham essa consideração e investiguem todos os casos a fundo”, ressalta Anna.
Alguns dos principais sinais que devem ser apurados durante a consulta são: congestão nasal, manchas claras ou avermelhadas na pele, dormência constante nas mãos e nos pés, além de falta de sensibilidade para temperatura ou dor. Na parte social, é importante verificar se houve contato com alguma pessoa diagnosticada com hanseníase.
Em 2022, mais de 17 mil novos casos de hanseníase foram diagnosticados no Brasil, como apontam dados preliminares do Ministério da Saúde. No ano anterior, foram registrados 18 mil casos — com 11,2% dos pacientes identificados com lesões consideradas graves nos olhos, mãos e pés.
Clique aqui e saiba mais sobre os sintomas da hanseníase, considerada uma doença negligenciada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em razão do pouco investimento dedicado ao seu enfrentamento.
Com objetivo aumentar a conscientização sobre o agravo, é celebrado no último domingo de janeiro, este ano, dia 29, o Dia Mundial da Hanseníase. No Brasil, o Dia Nacional de Combate e Prevenção da Hanseníase é comemorado em 31 de janeiro.
Serviço de Referência Nacional em Hanseníase junto ao Ministério da Saúde, o Ambulatório Souza Araújo realiza atendimento multidisciplinar para o agravo com assistência nas áreas de dermatologia, neurologia, enfermagem, fisioterapia, farmácia e assistência social.
O acompanhamento é feito do diagnóstico até a conclusão do tratamento e mesmo após quando for o caso. Também há integração de familiares e contatos próximos, que são testados para hanseníase e recebem orientações acerca da doença.
O Ambulatório é associado ao Laboratório de Hanseníase do IOC, que analisa os casos atendidos em busca de respostas à doença.
“Os atendimentos realizados no Ambulatório nos ajudam a construir o conhecimento sobre a hanseníase e suas dinâmicas. A partir deles desenvolvemos pesquisas que aprimoram diagnósticos, tratamentos e, quem sabe, encontrar uma estratégia de prevenção”, conclui Anna.
O Ambulatório Souza Araújo está localizado no campus Manguinhos-Maré da Fiocruz (Av. Brasil, 4365 - Rio de Janeiro). Mais informações pelo telefone (21) 2562-1594.
"Posso encostar no meu familiar ou cônjuge diagnosticado com hanseníase?"
"Temos que ficar em cômodos separados?"
"Precisamos distinguir copos e talheres?"
Essas são algumas das perguntas que refletem o estigma que ainda persiste em torno da hanseníase.
Apesar das manifestações clínicas ocorrerem na pele e no sistema nervoso periférico, a transmissão acontece por via respiratória, a partir de contato próximo e prolongado com gotículas de saliva eliminadas na fala ou secreções nasais do indivíduo infectado.
Outra característica significativa é que a transmissão somente acontece via pessoas com a forma multibacilar que não estejam em tratamento, devido à grande quantidade de bactérias no organismo.
“Quando dizemos contato próximo e prolongado, não necessariamente é um contato íntimo, como o beijo. Estamos falando da convivência por um determinado período de tempo em ambientes fechados, como casa, escritório ou sala de aula”, explica Anna Maria Sales, médica do Ambulatório Souza Araújo, unidade vinculada ao Laboratório de Hanseníase do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) que presta atendimento a pacientes com hanseníase, na sede da Fiocruz, no Rio de Janeiro.
“A pessoa para de transmitir a doença logo quando começa a fazer uso do medicamento. Isso reforça ainda mais a importância de buscar auxílio médico quando forem percebidos os primeiros sinais. Não há motivo para ficar relutante. Além de se curar e garantir qualidade de vida ao evitar sequelas, o paciente também evita a infecção de outros”, completa.
Embora muitas pessoas possam ser infectadas pelo bacilo M. leprae, a maioria consegue ter boa resposta imune e não desenvolve a doença. Ainda assim, devido ao seu lento período de incubação, que pode levar em torno de 2 a 5 anos, a médica reforça a importância de rastrear e examinar os contatos próximos do paciente nos últimos cinco anos.
“Precisamos avaliar não apenas as pessoas do ambiente domiciliar, mas também colegas de trabalho, escola, vizinhos, amigos próximos e parceiros. É importante rastrear todos que compartilharam de uma convivência mais próxima”, afirma Anna.
Os contatos passam por exames dermatoneurológicos para identificar possíveis manifestações da doença. Em alguns casos, pode ser feita uma investigação mais aprofundada. Caso a infecção não seja confirmada, é administrada uma dose da vacina BCG – a depender do histórico vacinal do contato.
“Se o contato tiver tomado apenas uma dose da vacina BCG ao longo da vida, será feita uma aplicação de reforço. Caso já tenha tomado as duas doses, não há necessidade de realizar outra. Esse protocolo é aplicado para os contatos tanto de pacientes da forma paucibacilar quanto multibacilar”, discorre a médica.
“Vale ressaltar que a vacina BCG não é específica para hanseníase, ou seja, não vai impedir que a pessoa tenha a doença. Contudo, a vacina evita um desenvolvimento mais grave caso ela venha a contrair a infecção”, acrescenta.
O tratamento da hanseníase é gratuito e deve ser iniciado logo após o paciente ser diagnosticado com a doença. Na forma paucibacilar, a terapia tem duração de 6 meses. Na forma multibacilar, o período é de um ano.
“Todo mês os pacientes precisam comparecer à unidade onde realizam o tratamento para fazerem a dose supervisionada, que é quando tomam a medicação do dia 1 acompanhados dos profissionais de saúde”, explica Anna.
Além da dose supervisionada, o paciente recebe também os medicamentos para serem tomados nos demais dias do mês.
O tratamento é ofertado nas Unidades Básicas de Saúde dos municípios e em Serviços de Referência associados ao Ministério da Saúde. No Rio de Janeiro, o Ambulatório Souza Araújo da Fiocruz é um desses Serviços.
Carinho e cuidado: a auxiliar de gestão do Ambulatório, Cristiane Domingues, faz questão de acompanhar de perto a evolução de cada paciente. Foto: Gutemberg Brito
“É importante que o paciente siga com a terapia até o fim. Seja na Unidade Básica, no hospital, ou no Serviço de Referência. Por isso, é imprescindível que todos esses locais tenham a medicação à disposição e profissionais da saúde prontos para atender”, reforça Anna.
Após curados, os pacientes precisam estar atentos a qualquer sinal de retorno da doença. Um dos motivos que pode levar a reincidência da hanseníase é a permanência de bacilos no organismo.
“Apesar de ser raro, o bacilo pode permanecer inativo no corpo e voltar a se multiplicar em algum momento da vida do paciente. Quanto mais regularmente o paciente seguir o tratamento, mais difícil a concretização desse cenário. Porém, como qualquer doença infecciosa, essa possibilidade não pode ser descartada”, aponta.
Outra forma de ocorrer a recidiva da hanseníase é contraindo novamente a infecção.
“A reinfecção não é comum, mas também pode acontecer se o paciente estiver em um ambiente endêmico com transmissão mantida. Por isso, é importante rastrear os contatos e tratar aquele grupo”, reforça.
O diagnóstico da hanseníase começa durante a anamnese – momento em que o profissional da saúde entrevista o paciente com perguntas específicas sobre sintomas e comportamentos que podem ajudar a desvendar o motivo das manifestações clínicas.
“A hanseníase só é identificada se o profissional que estiver atendendo pensar na doença, nem que seja por um breve momento. Por isso, é importante que médicos e enfermeiros tenham essa consideração e investiguem todos os casos a fundo”, ressalta Anna.
Alguns dos principais sinais que devem ser apurados durante a consulta são: congestão nasal, manchas claras ou avermelhadas na pele, dormência constante nas mãos e nos pés, além de falta de sensibilidade para temperatura ou dor. Na parte social, é importante verificar se houve contato com alguma pessoa diagnosticada com hanseníase.
Em 2022, mais de 17 mil novos casos de hanseníase foram diagnosticados no Brasil, como apontam dados preliminares do Ministério da Saúde. No ano anterior, foram registrados 18 mil casos — com 11,2% dos pacientes identificados com lesões consideradas graves nos olhos, mãos e pés.
Clique aqui e saiba mais sobre os sintomas da hanseníase, considerada uma doença negligenciada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em razão do pouco investimento dedicado ao seu enfrentamento.
Com objetivo aumentar a conscientização sobre o agravo, é celebrado no último domingo de janeiro, este ano, dia 29, o Dia Mundial da Hanseníase. No Brasil, o Dia Nacional de Combate e Prevenção da Hanseníase é comemorado em 31 de janeiro.
Serviço de Referência Nacional em Hanseníase junto ao Ministério da Saúde, o Ambulatório Souza Araújo realiza atendimento multidisciplinar para o agravo com assistência nas áreas de dermatologia, neurologia, enfermagem, fisioterapia, farmácia e assistência social.
O acompanhamento é feito do diagnóstico até a conclusão do tratamento e mesmo após quando for o caso. Também há integração de familiares e contatos próximos, que são testados para hanseníase e recebem orientações acerca da doença.
O Ambulatório é associado ao Laboratório de Hanseníase do IOC, que analisa os casos atendidos em busca de respostas à doença.
“Os atendimentos realizados no Ambulatório nos ajudam a construir o conhecimento sobre a hanseníase e suas dinâmicas. A partir deles desenvolvemos pesquisas que aprimoram diagnósticos, tratamentos e, quem sabe, encontrar uma estratégia de prevenção”, conclui Anna.
O Ambulatório Souza Araújo está localizado no campus Manguinhos-Maré da Fiocruz (Av. Brasil, 4365 - Rio de Janeiro). Mais informações pelo telefone (21) 2562-1594.
Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)
