Fiocruz
Biografia: Infância e formação

Oswaldo Cruz com um ano de idade, em 1873

Oswaldo Gonçalves Cruz nasceu em 5 de agosto de 1872, na cidade de São Luís do Paraitinga, na região do Vale do Paraíba, no estado de São Paulo. A pequena cidade hoje conta com pouco mais de dez mil habitantes e é famosa pelos festejos de carnaval. Era filho do médico Bento Gonçalves Cruz e de Amália Taborda de Bulhões, primos, ambos nascidos no Rio de Janeiro. Em 1871, depois de formado em medicina na capital fluminense, Bento seguiu com a família para São Luís do Paraitinga, sendo comum, na época, que jovens médicos dessem início à carreira no interior. Oswaldo seria irmão de cinco moças: Eugênia, falecida ainda criança, Amália, Alice, Noemi e Hortência.

Quando Oswaldo tinha cinco anos, a família mudou-se para o Rio de Janeiro. Viviam na Gávea, que, na época, era distante do centro, com ligação por linha de bonde. Alfabetizado pela mãe, já sabia ler. Em 1887, matriculou-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro – a mesma que seu pai cursara –, formando-se de maneira abreviada, em apenas quatro anos. Em 1889, aos 17 anos, já era noivo de Emília da Fonseca – sua Miloca.

Jovem, foi ajudante no laboratório de Benjamin Antônio da Rocha Faria e, quando o laboratório foi convertido em Instituto Nacional de Higiene, atuou como auxiliar do professor Rocha Faria, entre 1890 e 1893.

Ainda estudante de medicina, em 1892 publicou na revista Brazil-Medico um trabalho em que estudou “um micróbio das águas putrefatas encontrado nas águas de abastecimento da nossa cidade”, relacionado à tese que defenderia no mesmo ano e que seria publicada no ano seguinte. O pai Bento, que em janeiro daquele ano se tornara inspetor geral de Higiene, morreria em 8 de novembro de 1892, aos 47 anos. Vítima de doença renal, faleceu no mesmo dia em que a tese de Oswaldo foi apresentada.

Ainda em 1892, Oswaldo começou a trabalhar como auxiliar na Inspetoria Geral de Higiene. Com a morte do pai, assumiu as atividades de atendimento médico a funcionários da Companhia de Fiação e Tecidos Corcovado, criada em 1889, perto de onde moravam, na Gávea.

Em 5 de janeiro de 1893, Oswaldo e Emília se casaram. Como presente de casamento do sogro, comerciante, o jovem ganhou a estruturação de um pequeno laboratório de análises clínicas no pavimento térreo de sua residência.

Em um dos cadernos em que tinha o hábito de anotar orçamentos e aspectos da vida diária, na página interna, lemos a inscrição: “Nasci em 5 de agosto de 1872. Formei-me em 24 de dezembro de 1892. Casei-me em 5 de janeiro de 1893.” Aquele era o horizonte do jovem de apenas 20 anos, que estava dando início à trajetória profissional e à construção de uma família. No curto período de 15 anos seguintes em sua linha do tempo se acrescentariam ainda: diretor geral de Saúde Pública, responsável pelo controle da varíola, febre amarela e peste bubônica no Rio de Janeiro e líder de um instituto de pesquisa que levaria seu próprio nome.

Desde sua formatura, Oswaldo passou a frequentar a Policlínica Geral do Rio de Janeiro, onde conheceu o médico Egydio Salles Guerra, chefe de clínica. O neto Eduardo Oswaldo Cruz conta que simpatizaram de imediato. Depois, Salles Guerra seria acionado para tratar de um dos filhos de Oswaldo quando doente. Em 1894, Oswaldo foi convidado por Salles Guerra a trabalhar na Policlínica, onde montou um laboratório de análises clínicas. Ele reconheceria ainda outra vez a capacidade do jovem ao indicá-lo para o cargo de diretor geral de Saúde Pública, em 1903, na oportunidade em que fora ele próprio consultado se gostaria de assumir o posto.

Ainda em 1894, Oswaldo Cruz assumiu atividade junto ao Instituto Sanitário Federal, trabalhando no diagnóstico da cólera na região do Vale do Paraíba. Na época, publicou um trabalho sobre “Causas e meios de prevenção do Cholera”, assinado sob o pseudônimo de Ignarus.

Entre 1897 e 1899, viveu em Paris, na França, com a família, na rua Marbeuf. O casal já tinha dois filhos, Elisa e Bento, e a terceira, Hercília, nasceria no exterior. Na ‘cidade luz’, se dedicava simultaneamente ao Instituto Pasteur, onde estudava microbiologia, e ao Laboratório de Toxicologia, onde aprendia medicina legal.

O Instituto Pasteur havia sido criado oficialmente em 1888 e, no ano seguinte, Émile Roux abriria lá o primeiro curso de microbiologia oferecido no mundo. Durante a temporada na França, Oswaldo aprendeu os processos de confecção de utensílios de vidro para laboratório, o que seria fundamental para as atividades científicas no seu regresso ao Brasil. Também se dedicou a estudar o sistema urinário – Ezequiel Dias relata que motivado a ajudar um amigo. A temporada na França resultou em álbuns repletos de fotografias produzidas pelo cientista.

No Laboratório de Toxicologia, participou do esclarecimento de um caso de envenenamento recorrendo a estudos de experimentação. No Instituto Pasteur, foi acolhido pelo Dr. Roux. Visitou a preparação de soros, experiência relatada na revista Brazil-Medico. Nunca precisou indenizar os materiais de trabalho e animais de experimentação – o que era praxe. Quando questionou o motivo da gratuidade, soube que este era um reconhecimento por ser brasileiro, tendo em vista que o imperador Dom Pedro II contribuíra para a criação do instituto. Firmou amizade com o russo Elie Metchinikoff, que havia descrito o processo de fagocitose celular. Como sua primeira esposa era da Ilha da Madeira, em Portugal, Metchinikoff gostava de conversar em português com Oswaldo e chegou a convidá-lo para trabalhar em seu laboratório.

Em carta a Salles Guerra, Oswaldo conta que, ao voltar, pretendia montar um laboratório “destinado a auxiliar o diagnóstico microbiológico das diversas entidades mórbidas”, o que realiza no seu retorno ao Rio de Janeiro. Estruturou o Gabinete de Microscopia e Microbiologia Clínica, que oferecia diversos serviços de análises clínicas, como exames de urina e sangue, algo inovador na cidade. O livreto de divulgação do gabinete descreve que tinha “o fim de prestar aos Srs. clinicos o auxilio indispensavel da microscopia e da microbiologia para o diagnostico e prognostico das molestias”.

De volta ao Brasil em 1899, com a esposa e os três filhos, reassume os trabalhos que o pai exercia na Companhia de Fiação e Tecidos Corcovado. Retoma também o trabalho na Policlínica Geral do Rio de Janeiro. Montou ainda um consultório no centro da cidade, juntamente com Luís Barbosa e Cândido de Andrade. De imediato, morou na casa do sogro, no Vidigal. Depois, mudou-se com a família para a rua Voluntários da Pátria, 128, em Botafogo – a mesma casa que seria apedrejada, tempos mais tarde, durante as manifestações contra a vacinação obrigatória, quando se tornou diretor geral de Saúde Pública.

No final de 1899, a peste bubônica - peste da Índia, como se dizia à época - apresentava um quadro que, nos termos de hoje, chamaríamos de uma doença emergente. Assim como os pesquisadores Adolpho Lutz e Vital Brazil, Oswaldo Cruz é incumbido de estudar a situação no porto de Santos, litoral de São Paulo, onde os casos despertavam atenção – Oswaldo foi designado pelo governo federal, integrando a equipe da Diretoria Geral de Saúde Pública liderada por Eduardo Chapot Prévost, enquanto Lutz e Vital Brazil foram enviados pelo governo estadual. Segundo o relato de Rui Barbosa durante o discurso em homenagem à morte do sanitarista, Oswaldo “reconhece para logo o micróbio de Yersin, certifica a presença da epidemia, e, num relatório cabal, com o desembaraço, a presteza, a segurança de quem pisa em terreno conhecido, formula o sistema de providências, a que deve obedecer a debelação da temerosa enfermidade”. Rui Barbosa descreve que a proporção entre mortos e doentes durante as epidemias de peste chegava a 70%.

Nas anotações de Oswaldo Cruz sobre as atividades em Santos, o nome de Vital Brazil está entre os pacientes tratados. Em carta, relatou à esposa a angústia em ver os colegas adoecendo, temendo que lhe acontecesse o mesmo.

Candidatou-se à Academia Nacional de Medicina em 1899, com a apresentação do trabalho “Les altérations histologiques dans l´empoisonnement par la ricine”, referente ao caso que elucidou no Laboratório de Toxicologia de Paris. Em pouco tempo, iniciaria sua trajetória em Manguinhos.


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